Instituto Guaicuy

Encontro de Comissões unifica pessoas atingidas da Região 5 na luta pela reparação integral

29 de novembro, 2023, por Wesley Costa

A cidade de Pompéu (MG) recebeu, no sábado (25), um evento muito importante para a luta das pessoas atingidas pelo desastre-crime da Vale. Lá foi realizado o 2º Encontro de Comissões da Região 5, o primeiro que unificou as Comissões das duas margens, oeste e leste, da Represa de Três Marias, além de pessoas atingidas da calha do Rio São Francisco e do Rio Pará.

74 pessoas atingidas participaram do Encontro, representando 24 diferentes Comissões, entre elas comunidades de Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs), a do Povo Indígena Kaxixó, o grupo Guiados Pelo Axé, de pessoas de religião de matriz africana, e ribeirinhos da calha do São Francisco. O evento teve início com a leitura de um poema sobre a luta pela reparação por Lubiana Pereira Bruno, da Comissão de Faveira, Buritizinho, Riachão e Ilha do Mangabal (FABURIMA). Em seguida, Paula Constante e Jonas Veloso, coordenadores do Guaicuy nas Regiões 5 Oeste e Leste, respectivamente, apresentaram a programação do evento, lembrando que ela foi construída em conjunto com as pessoas atingidas por meio da Secretaria Organizativa. “A Região 5 é uma só, é muito forte, e vai mostrar sua potência nesse Encontro”, disse Jonas Veloso. 

As Comissões são formadas por pessoas atingidas com o objetivo de garantir a participação ativa e o controle social no processo de reparação. Sua composição deve garantir a diversidade de grupos dos territórios que foram prejudicados pelo desastre-crime da Vale. Além disso, os grupos buscam  igualdade de participação entre homens e mulheres e inclusão de minorias sociais, tais como pessoas negras, mulheres, juventudes, indígenas, pessoas LGBTQIA+, entre outras. 

Antes do início dos debates, foi realizada uma homenagem a João Rodrigues, pescador e morador de Lago dos Cisnes, comunidade de Felixlândia, que construía ativamente a Comissão de Pessoas Atingidas de Paraíso dos Cisnes. João faleceu em outubro e foi uma das muitas pessoas atingidas a morrer lutando pelos direitos das pessoas atingidas e sem ter acesso a uma reparação justa e integral. 

Acesse aqui todas as fotos do Encontro de Comissões da Região 5 

Grupos debatem a Instância Regional

Durante o período da manhã, os participantes do Encontro foram divididos em 5 grupos para debater de maneira mais aprofundada a Instância Regional do Sistema de Participação. O Sistema de Participação busca organizar e garantir a participação e o protagonismo popular nas diversas etapas e eixos do processo de reparação dos danos do desastre. Ele é dividido em instâncias: local (de uma só Comissão ou comunidades e coletividades vizinhas); regional (de toda uma região, como é o caso da Região 5) e inter-regional (de todas as pessoas atingidas da bacia, desde Brumadinho até Três Marias). 

Os grupos discutiram os principais avanços das Comissões até o momento, quais são os princípios seguidos por elas, as formas de organização e os avanços desejados para os próximos tempos e também quais são os anseios e as formas de organização das pessoas atingidas em relação à Instância Regional. Após os debates, apresentaram brevemente uma sistematização das discussões para o conjunto dos participantes. 

Entre os pontos mais repetidos pelos representantes dos grupos nas plenárias, foram citados: os avanços das Comissões em comunicação, união, conhecimento do processo e em formular propostas coletivas. Também, a necessidade de avançar em controle social e em democracia no processo de reparação. “Até hoje, decidiram tudo por nós”, afirmou Altino Rodrigues Neto, da Comissão FABURIMA.

Sobre a participação informada, os grupos também ressaltaram a necessidade de melhorar a comunicação entre as pessoas atingidas por parte de todos os atores do processo, já que nem todo mundo entende os termos técnicos do processo de reparação. Outro ponto levantado foi a importância da construção de um regimento interno para a Instância Regional, aos moldes do que as Comissões têm feito, com auxílio do Guaicuy. 

“As ideias aqui são todas parecidas, parece até que um grupo está copiando do outro”, disse Ivane Barcelos, da Comissão Sede Morada Nova e Entorno, demonstrando a sintonia e unidade das pessoas atingidas nos debates do Encontro. 

Apresentação do grupo Sentinelas

Antes do almoço, o recém-criado grupo auto-organizado de pessoas atingidas na Região 5 pediu a palavra para se apresentar aos demais participantes. O grupo Sentinelas fez um convite à participação e à defesa dos direitos das pessoas atingidas na Região 5, apresentou seu logo, seus objetivos e fez a leitura de uma carta de apresentação direcionadas às IJs que foi assinada pelos atingidos. O Sentinelas também foi saudado pelo Guerreir@s, outro coletivo auto-organizado de pessoas atingidas.

Anexo 1.1

Após o almoço, a plenária foi retomada para continuar os debates sobre a Instância Regional. Depois, os participantes do Encontro foram novamente divididos em grupos, dessa vez para debater o Anexo 1.1 do Acordo Judicial de Reparação (projetos de demandas das comunidades e linhas de crédito e microcrédito). Foram criados 6 grupos e cada um tratou de um tema diferente dentro do âmbito do Anexo 1.1. 

  • O primeiro simulou uma conversa com a Cáritas, entidade responsável por gerir parte dos recursos do Anexo 1.1, discutindo sobre a elaboração de critérios e princípios para sua execução. 
  • O segundo levantou as potencialidades locais e regionais, relacionando aos principais danos sofridos nos territórios para dar embasamento na elaboração dos projetos. 
  • O terceiro ficou responsável por relembrar quais são os atores presentes no território (em especial, os que atuam no Anexo 1.1 do Acordo), hierarquizar o nível de diálogo desses atores com as pessoas atingidas e indicar o nível de confiança que as pessoas atingidas têm em relação a eles. 
  • O quarto grupo teve como meta construir coletivamente uma proposta de planejamento regional no âmbito do Anexo 1.1. 
  • O quinto trabalhou os critérios e as potencialidades dos Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) para dar embasamento para elaboração dos projetos direcionados a estes grupos. Também foi um espaço de troca de experiências sobre projetos e potencialidades entre as lideranças dos PCTs das duas regiões.
  • Já o sexto teve como tarefa elaborar uma carta com as reivindicações das pessoas atingidas, que foi apresentada em plenária para aprovação de todas as comissões presentes. 

Após os debates, representantes dos grupos compartilharam seus entendimentos na plenária. A carta produzida pelo Grupo 6 foi lida, debatida e aprovada por todos os presentes. 

“Estamos construindo um aprendizado que, daqui desse Encontro, vamos levar para nossa vida pessoal. Das ideias, passamos a planejar. Aqui estamos planejando para as comunidades e para as pessoas atingidas. O Encontro vai fortalecer as Comissões capacitando as Comissões, e elas sendo multiplicadoras para as comunidades”, avaliou Marco Aurélio Sachi, da Comissão SG Salto. 

Ciranda

Foto: Pedro Lavigne/ Instituto Guaicuy

Durante todo o evento, a equipe do Guaicuy organizou um espaço de ciranda para as crianças, possibilitando assim a participação dos pais e responsáveis nos debates. As crianças também produziram uma carta sobre o rompimento e a luta por reparação, que foi lida na plenária e ovacionada pelos presentes.

“Eu quero a varanda cheia de peixe, o rio todo cheio de peixe, todo limpo. Eu vou cobrar a  Vale! Vocês vão limpar o rio? Eu quero tudo limpo! Vale, ajuda a gente, se não, nós vamos cobrar!”, falou Isabela da Silva, de Poções das Paineiras.

Encerramento

Coube à Carla Wstane, diretora do Instituto Guaicuy, a fala de encerramento do 2º Encontro de Comissões da Região 5. Carla citou as dificuldades do processo de luta pela reparação integral ao longo de quase cinco anos, desde a eleição das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), passando pelo período de pandemia de Covid-19. 

“Nossa luta é muito grande. Estamos aqui, no Encontro de 8 cidades, com diversidade social e cultural, e conseguimos avançar nas conexões. Estamos atravessando uns a vida dos outros. Vocês atravessam as nossas vidas desde 2019. É um grande encontro de pessoas, de almas, aqui. A gente segue vivendo e tentando viver em meio a esse caos, de cabeça erguida, fabricando esperança”, disse a diretora do Guaicuy. 

Após um breve momento de avaliação do Encontro, as pessoas atingidas retornaram às suas casas para seguirem lutando pela reparação integral e fazendo avançar a unidade entre as Comissões de toda a Região 5. 

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