No dia 15 de agosto, movimentos sociais realizaram a Caminhada pela paz e em defesa dos atingidos pela mineração
Vestidos de branco, segurando faixas, balões e com a esperança de dias melhores, um grupo formado por cerca de 30 moradores e moradoras de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto/MG, participou do Jubileu de Nossa Senhora da Lapa pedindo paz para o distrito. Eles fizeram parte da Caminhada pela paz e em defesa dos atingidos pela mineração, realizada na terça-feira (15/08).
O evento teve início com concentração na Rua da Lapa, ao lado da Igreja Matriz de Nossa Senhora das Mercês, e seguiu até a gruta de Nossa Senhora da Lapa, onde se juntou com outras dezenas de fiéis que participavam da festa em celebração à santa de tradição tricentenária.
Nos últimos anos, a população do Pereira, como é popularmente conhecido, viu seu território e seus modos de vida serem atingidos pelos danos da mineração predatória praticada pela empresa Vale. Com as obras de descomissionamento da Barragem Doutor, os danos à saúde física e mental, assim como a perda de vínculos comunitários, tradicionais e familiares, e os prejuízos econômicos se tornaram cada vez mais graves.
Associado ao cenário de precarização do distrito, a população também viu aumentar os casos de violência, criminalização do território e violações de direitos. Por isso, a população tomou a iniciativa de organizar a caminhada. O objetivo do ato foi chamar atenção para os problemas enfrentados em Antônio Pereira, aliando luta, resistência e fé.
A mobilização popular foi uma iniciativa do Movimento Antônio Pereira, do Grupo Mulheres Guerreiras e da Associação dos Garimpeiros de Antônio Pereira, além de contar com o apoio do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), de parlamentares de Minas Gerais, do Sindicato dos Metalúrgicos de São Julião e do Instituto Guaicuy, que atua como Assessoria Técnica Independente das pessoas atingidas pela Barragem Doutor.
Ivone Zacarias é moradora de Antônio Pereira. Ela conta que há 50 anos, desde que era criança, participa da festa de Nossa Senhora da Lapa. Para ela, essa é uma tradição importante que ela faz questão de passar para as próximas gerações. O último dia 15 de agosto também ficou marcado como um dia de luta para Ivone.
“Já faz 300 anos da aparição da imagem de Nossa Senhora da Lapa. Então, ela é nossa padroeira, é ela que derrama bênçãos e graças na nossa comunidade. Pra mim é muito importante participar todos os anos. Sobre a caminhada, a gente pediu paz. Com essas mineradoras, a gente não tem mais paz, sossego. Nossa vida virou um transtorno. É poeira toda hora, nossa saúde não é mais a mesma. Inclusive, as mineradoras negam que somos atingidos, mas nós somos atingidos, e muito”, diz dona Ivone.
Presente no distrito atuando como Assessoria Técnica Independente das pessoas atingidas pela Barragem Doutor, o Instituto Guaicuy foi um dos apoiadores da caminhada. “O que a gente tem visto nesse processo de atuação em Antônio Pereira é que a gente precisa cada vez mais fortalecer a organização social, porque toda a população do distrito é atingida pela mineração”, comenta Ronald Guerra, coordenador-geral da ATI Antônio Pereira e vice-presidente do Guaicuy. Ainda sobre o fortalecimento dos movimentos sociais e a realização da caminhada, Ronald acredita que o evento teve o papel de unir todos pela paz e por melhor qualidade de vida no distrito de Antônio Pereira.
Quem também comentou sobre a importância da caminhada foi Letícia Oliveira, da coordenação estadual do MAB. “A gente entende que fazer essa caminhada de fé pela paz é muito importante, mostra a resistência do povo de Antônio Pereira. O MAB está aqui junto para mostrar que o movimento entende que essa é uma luta justa e que é muito importante para denunciar o que acontece com a comunidade há muitos anos, todo sofrimento. E que a gente não desiste de enfrentar o poder das empresas e do Estado, que têm que garantir os direitos da comunidade”, diz.
O distrito de Antônio Pereira tem mais de 300 anos de história. Próximo à data de fundação da comunidade, também teve início a devoção à Nossa Senhora da Lapa, celebrada no dia 15 de agosto. A tradição religiosa começou quando crianças tiveram visões de Nossa Senhora, em sua face de devoção de Conceição da Lapa, em uma gruta, situada no alto do distrito.
A partir das aparições, começou a história de peregrinação e devoção a Nossa Senhora da Lapa, que se mantém viva até hoje. Devido à grande quantidade de fiéis que visitam a gruta todos os anos, a igreja católica realiza na primeira quinzena de agosto o Jubileu de comemoração da santa, que já está na 23º edição.
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