Instituto Guaicuy

A importância da organização das pessoas atingidas para a reparação

2 de setembro, 2024, por Camila Bastos

O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, em janeiro de 2019, evidenciou a urgência da organização da sociedade civil e da participação popular para conquistar uma reparação justa e efetiva. A resposta a esse desastre-crime não pode ser completa sem a voz e a ação das pessoas atingidas. É nesse contexto que a organização civil se torna central, seja nas instâncias de participação, ou nos grupos auto-organizados formados ou fortalecidos ao longo do território atingido.

“A organização das pessoas atingidas é um direito de todos nós. Só a gente sabe o que passou. Eu comecei a me envolver porque a maioria das pessoas daqui da região é de idade, tem dificuldade com internet, às vezes não tem celular. Eu consegui entrar no Programa de Transferência de Renda (PTR), mas tem muita gente que tem direito e ainda não conseguiu”, reflete Jeane Pereira da Silva. Ela vive em Cachoeira do Choro, comunidade de Curvelo, e é integrante da Comissão Cachoeira do Choro e Encontro das Águas.

Mais do que um direito, a participação popular é fundamental para que o processo de reparação não se torne apenas um exercício burocrático, mas uma verdadeira resposta às necessidades das pessoas atingidas. Quando a comunidade está engajada e organizada, há maior transparência e eficiência na aplicação dos recursos destinados à reparação. “Quanto mais organizadas as pessoas atingidas estiverem, maior será a capacidade e possibilidade de que seus direitos e demandas sejam atendidos e respeitados. Organizadas, elas podem dialogar com os gestores do Acordo, bem como comunicar com a sociedade de maneira eficiente, coerente e planejada, através de uma voz coletiva e não de ações individuais isoladas”, avalia Pedro Aguiar, assessor do Instituto Guaicuy.

Outro ponto importante a respeito da organização civil é que ela fortalece o tecido social das comunidades afetadas, promovendo a solidariedade e a cooperação. Ao envolver as pessoas atingidas na tomada de decisões, promove-se um senso de pertencimento e empoderamento, essencial para a recuperação emocional e social das comunidades.

“Hoje as pessoas se importam mais uma com as outras, principalmente depois que alguns começaram a conseguir o PTR. Foi todo mundo vendo que a luta coletiva traz resultados e hoje as pessoas estão envolvidas até nas questões além da reparação, como no fortalecimento da nossas associaçã comunitária”, afima Jeane.

Além da participação na Comissão, Jeane também colaborou pontualmente com as atividades do Guerreir@s, um dos grupos auto-organizados da região, que até o primeiro semestre de 2024 se dedicou com afinco e dedicação na luta pela reparação.

A proposta de criação do Sistema de Participação

A ideia é que esse sistema tenha como objetivo garantir que as pessoas atingidas tenham papel ativo na definição e na implementação das medidas de reparação do Acordo Judicial e nos temas do processo (como as medidas emergenciais ou as indenizações individuais).

Ele poderá ser composto por várias instâncias de participação, que vão desde Comissões locais, até fóruns regionais e estaduais. Dentre essas instâncias, destaca-se o papel das Comissões de Pessoas Atingidas, que nas Regiões 4 e 5 (comunidades do Baixo Paraopeba e do entorno da Represa de Três Marias na divisão das Instituições de Justiça) foram construídas a partir dos Núcleos Comunitários.

Esses Núcleos funcionam como células fundamentais na estrutura de participação. Eles reúnem moradores para discutir problemas, identificar necessidades e elaborar propostas de reparação.

Comissões de Pessoas Atingidas: Voz e ação das comunidades

As Comissões de Pessoas Atingidas são formadas por membros das comunidades impactadas pelo rompimento da barragem. Elas têm um papel multifacetado e atuam, entre outros, como intermediárias entre a comunidade e as instâncias superiores de decisão, como os fóruns regionais e estaduais. Além disso, elas têm a responsabilidade de acompanhar a execução dos projetos de reparação, garantindo que sejam realizados de acordo com os interesses e as necessidades das comunidades.

Instâncias regionais

As Instâncias Regionais do Sistema de Participação visam garantir a participação efetiva das pessoas atingidas no âmbito de cada regional. Há avanços na organização regional em vários aspectos. Por exemplo, no desenvolvimento de pautas específicas de cada região, como a melhoria das condições materiais das Comissões e a continuidade do trabalho das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs). Além disso, há um esforço para integrar as ações com toda a Bacia e fortalecer a comunicação com demais atores do processo, especialmente as Instituições de Justiça. Uma das ferramentas mais fortes para a organização regional é o Encontro Regional de Comissões.

 

Imagem: Camila Bastos/Instituto Guaicuy

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