Sabemos que o acesso à água e ao saneamento básico é garantia para o equilíbrio na saúde. Isso envolve um ambiente saudável, incluindo água, solo, ar, vegetação e animais do entorno. Após três anos do desastre-crime da Vale em Brumadinho, as pessoas das comunidades atingidas apresentaram quadros de saúde que podem estar associados ou terem sido agravados devido ao rompimento. Neste artigo você vai conhecer as substâncias encontradas nas análises e a relação com sua saúde.
Com o intuito de buscar respostas sobre os impactos do rompimento da barragem, o Guaicuy tem realizado análises de amostras de água superficial, sedimentos e solos coletadas nas regiões 4 (Pompéu e Curvelo) e na área 5 (comunidades do entorno do Lago de Três Marias). Em algumas amostras foram encontradas quantidades alteradas de metais e outros contaminantes.
É válido dizer que os metais estão naturalmente presentes no meio ambiente, nas rochas, solos, água e ar. Entretanto, a ação humana pode aumentar a concentração deles no meio ambiente. Por exemplo: lançamento de esgoto industrial não tratado e rejeitos de mineração. Os seres humanos podem ser expostos a esses elementos através da ingestão de água e alimentos, inalação ou absorção pela pele.
Estes metais têm o potencial de bioacumulação, ou seja, após serem absorvidos pelo organismo dos seres vivos, são acumulados em seus corpos ao longo do tempo. O processo de bioacumulação de metais pode gerar diversos adoecimentos nos organismos vivos (plantas, animais e humanos).
Apesar de alguns metais serem encontrados naturalmente nos ambientes, algumas atividades humanas como a mineração, por exemplo, podem causar alterações nos níveis desses metais nas águas dos rios.
A exposição aos metais, além do limite considerado tolerável, pode promover alterações em seres vivos e no funcionamento do corpo por diferentes formas. Sua capacidade de acumular em órgãos do corpo como fígado, coração, rins e cérebro, pode alterar o funcionamento normal do organismo.
Alguns desses metais são importantes, em doses baixas, para o funcionamento adequado das funções do corpo, como o ferro, o zinco e o manganês. Mas, quando em doses altas, podem causar alterações na condição de saúde das pessoas.
As pessoas tendem a acreditar que apenas um único contato com os metais é suficiente para o desenvolvimento de doenças e sintomas. Todavia são as exposições repetidas que podem aumentar a concentração desses metais no corpo a partir da biocumulação. Isto pode repercutir, ao longo dos anos, no aparecimento ou agravamento de doenças diversas.
No entanto, há muitas variáveis que interferem para o aparecimento de sintomas. A quantidade de metal absorvida nem sempre é suficiente para provocar sintomas
É possível que o crime-desastre da Vale seja a principal e mais forte hipótese de ser a fonte-origem da contaminação das águas e do solo com metais nas regiões 4 e 5, em virtude de sua magnitude. Mas, ainda não é possível garantir que essa seja a fonte prioritária da contaminação, exigindo mais análises profundas e investigação detalhada para realizar essa afirmação.
Entretanto, não é possível desconsiderar o expressivo volume de rejeitos despejados na Bacia do Paraopeba com o rompimento das barragens da Vale no rio (evento que apresenta grande probabilidade de explicar parâmetros químicos alterados em toda análise de água fluvial).
Por outro lado, a bacia é altamente utilizada em toda sua extensão, com o desenvolvimento de diferentes atividades humanas. Elas podem explicar a identificação das concentrações dos metais na região do Paraopeba.
Outras atividades que podem ser fonte/origem de contaminação por metais são: operações de mineração e fundição, produção, refinarias e transformação de matérias primas, uso doméstico e agrícola de metais e compostos, tintas e pesticidas contendo metais, plásticos, têxteis, microeletrônica, preservação de madeira e fábricas de processamento de papel, curtumes, entre outras atividades produtivas.
A exposição ambiental ocorre simplesmente em virtude da disponibilidade no meio ambiente desses metais, por meio de ações humanas. Os outros modos de exposição aos metais estão relacionados ao uso médico, mas em virtude da utilização errada ou acidental, levando a superdosagem de algum componente (sobredosagem).
Os efeitos da exposição aos metais são difíceis de avaliar, pois as pessoas podem ter reações diferentes diante de exposições com as mesmas concentrações e vias de administração semelhantes.
A intoxicação por metais depende, portanto, de vários fatores. Isso inclui a dose, o tipo de metal e o tempo de exposição da pessoa ao metal, por exemplo. Além de condições de saúde geral, idade, sexo e genética de cada indivíduo
Outros fatores podem aumentar o risco de alterações das condições de saúde das pessoas, devido às exposições ambientais, condições precárias de saneamento e subnutrição, falta de informação, dentre outros.
Em relação aos metais (ferro, zinco, manganês e alumínio) identificados como alguns dos parâmetros alterados nas análises de água coletadas pelo Instituto Guaicuy, ressalta-se que ferro, zinco e manganês em baixas doses fazem parte dos metais essenciais para o organismo humano.
Já em doses elevadas, com biocumulação após sucessivas exposições, esses metais podem desencadear manifestações clínicas. Porém, a contaminação ambiental por ferro é mais difícil em virtude do gosto ruim que ocasiona a presença do metal, o que diminui a ingestão de água contaminada.
Segundo a Agência para Substâncias Tóxicas e Registros de Doenças dos Estados Unidos – ATDR/CDC, o alumínio pode causar problemas respiratórios, como tosse, doença renal, ósseas e cerebrais. Em crianças e fetos, o alumínio pode retardar o desenvolvimento ósseo e neurológico. O zinco pode gerar dores abdominais, náuseas e vômitos. A longo prazo pode causar anemia e diminuir os níveis de colesterol bom.
O manganês pode provocar alterações comportamentais e outros efeitos no sistema nervoso, que incluem movimentos que podem tornar-se lentos e desajeitados. Além disso, o manganês pode despertar irritação nos pulmões e no sistema reprodutivo. Em crianças pode alterar o desenvolvimento, causando alterações no comportamento e diminuição na capacidade de aprendizagem e memorização.
Os sinais e sintomas descritos acima, por exemplo, podem compreender uma grande gama de doenças das mais variadas origens e causas (infecciosas, cardiovasculares, genéticas, metabólicas, autoimunes, entre outras). Desta forma, a intoxicação não pode ser presumida e deve ser investigada com apoio clínico.
Tem sinais ou sintomas? Procure um profissional de saúde capacitado Apenas a avaliação de um profissional de saúde capacitado do conjunto de sinais e sintomas, bem como as informações epidemiológicas e ambientais e com o auxílio de exames laboratoriais, será capaz de determinar a possibilidade de uma contaminação por metal pesado.
O fato de um indivíduo de uma comunidade onde há suspeita de contaminação por metais apresentar um dos sintomas descritos acima, não é suficiente para diagnosticar a intoxicação, devendo ser investigada a origem dos sinais e sintomas que podem estar relacionados a outras causas de diversas origens.
É imprescindível entender que a exposição ambiental não é sinônimo de intoxicação. O desenvolvimento de sinais e sintomas e de doenças específicas não ocorre em todos os indivíduos expostos aos metais. Mas existe sim um risco aumentado que deve ser eliminado e, quando não for possível de ser resolvido, pelo menos diminuído.
Portanto, quando houver suspeita ou confirmação de alterações dos parâmetros analisados na água que você utiliza para consumir ou irrigar plantações de alimentos, é recomendado buscar outras fontes alternativas de abastecimento. Isso através dos órgãos responsáveis pela distribuição, tratamento e monitoramento da qualidade da água para consumo humano.
O Instituto Mineiro de Gestão de Água (Igam) recomenda a não utilização da água do Rio Paraopeba na região 4 para qualquer finalidade. Já na região 5 não há restrição quanto ao uso da água da UHE de Retiro Baixo e Represa de Três Marias, exceto para beber.
ATENÇÃO:
Além dos parâmetros de metais citados, outras alterações valem ser destacadas aqui, como a quantidade de bactérias (coliformes e Escherichia coli) e cianeto que foi identificada nas análises. Essas bactérias podem causar sinais e sintomas gastrointestinais, como vômitos, diarreias, dores abdominais.
Já o cianeto pode provocar alterações graves na saúde, especialmente no sistema nervoso central e cardiovascular. Alguns dos sinais e sintomas são: dor de cabeça, tontura, mal estar, diminuição da coordenação motora e alterações dos batimentos cardíacos. A exposição por tempo prolongado pode provocar dor de cabeça, dificuldade para falar, alterações gastrintestinais, fraqueza muscular, confusão, perda de visão e aumento da tireoide.
Assim como os metais, nem toda exposição ao cianeto vai causar intoxicação e desencadeamento de manifestações clínicas. As recomendações quanto ao uso da água por órgãos oficiais, como o Igam, devem ser seguidas e ao sinal de qualquer alteração da saúde, é essencial que se procure atendimento médico.
Se você quiser saber mais sobre os parâmetros na região 5, clique aqui. E se quiser saber sobre os parâmetros da área 4, clique aqui.
Caso queira entender melhor a respeito do que são cada um dos metais e do cianeto? Acesse os links abaixo.
*Este artigo foi escrito pelas equipes de Estudos Ambientais e de Saúde e Assistência Social do Instituto Guaicuy.
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