A primeira reunião da Comissão de Pessoas Atingidas de Antônio Pereira revitalizada contou com a presença de cerca de 50 pessoas dispostas a lutar pela reparação justa dos danos causados pela Vale no distrito.
Denúncias, indignação, acolhida, afeto, união, coragem, força e fé. Essas palavras conseguem sintetizar o que aconteceu na noite da última segunda-feira, dia 17/6, durante a primeira reunião da Comissão de Pessoas Atingidas de Antônio Pereira deste ano. A reunião representa um marco para o coletivo, sendo o primeiro encontro após o processo de revitalização da Comissão promovido em parceria com o Instituto Guaicuy, que atua como Assessoria Técnica Independente da comunidade desde dezembro de 2022.
Durante a reunião, que ocorreu simultaneamente, presencial e virtualmente, Alexandre D’Angelo, Cida Rosa, Paulo Amorim entre outros integrantes veteranos da Comissão deram as boas vindas aos novos membros, que chegaram trazendo energia nova para essa importante instância de luta pela reparação integral dos danos causados pela Vale no distrito. Participante virtual da reunião, Cida Rosa destaca a importância dessa chegada de novos membros: “Sejam muito bem-vindos e venham preparados. Cada um com seu dom, cada um com seu talento, cada uma com sua disponibilidade, todos que vieram para ajudar. Nós precisamos muito de ajuda!”
Para o veterano da Comissão e morador removido da Vila Residencial Antônio Pereira, Paulo Amorim, a importância da presença dos integrantes da Comissão nos espaços de construção da luta pela reparação é fundamental. “É importante a presença, principalmente nas reuniões. É lógico que não vai ser todos os dias que nós vamos poder participar de uma reunião, mas participar gera valor, principalmente na hora de estar reivindicando os nossos direitos, porque todos nós somos atingidos, independente de onde mora”.
Uma das novas representantes, Alessandra Maria Santos Rapallo, moradora e representante da região dos Ribeirinhos e Tabuleiro, destaca o foco do encontro. “Eu notei uma reunião mais objetiva para construir mesmo essa Comissão, para unir e levar adiante o nosso objetivo, que é andar junto e vencer essa luta”, pontuou. Para Alessandra a função da Comissão é ouvir e apoiar a comunidade. “Levar essas informações para os órgãos responsáveis, seja o Ministério Público, a juíza ou a empresa, seja quem for”. Giovana Santana Gonçalves, nova representante da região da Baixada, Projetadas e Loteamento Dom Luciano também aponta o que acredita ser o papel deste coletivo. “Essa comissão vai ser justamente para a comunidade, para ajudar a comunidade a conversar com pessoas e instituições que muita gente não tem condições de chegar perto e nós vamos ter essas condições agora”.
Representatividade e denúncia
A Comissão revitalizada agora conta com representantes de todas as regiões de Antônio Pereira, o que fortalece a legitimidade desse grupo. Rosimeire Aparecida de Paula (Rose), é uma das representantes da região da Pedreira, Igreja Queimada, Centro Histórico e Lapa na comissão de Antônio Pereira. Ela evidencia justamente essa diversidade fundamental para o bom funcionamento e atuação da comissão. “Eu acho que nós estamos aqui com o mesmo ideal e eu acredito muito na força dessa comissão. Eu acho que Antônio Pereira está muito bem representado aqui. Temos pessoas de várias ruas do distrito”.
Rose fala da união e do apoio mútuo, essenciais para a comissão enfrentar os desafios que são cotidianos. “A gente precisa estruturar um ao outro, porque nós estamos lutando contra um gigante! E vai ser uma luta árdua, mas eu acredito muito que vai dar certo”. Ela comenta sobre a importância das atividades da ATI realizada pelo Instituto Guaicuy e da presença do GEPSA, perito da Justiça no processo de reparação dos danos causados pela Vale em Antônio Pereira. “Nós estamos muito bem estruturados, tem o GEPSA e o Instituto Guaicuy aí. A gente precisa trocar e somar forças”.
Comungando de um sentimento de revolta que acomete a população do distrito, ela se vê na dor das outras pessoas de Antônio Pereira. “Eu acho que o sentimento é bem parecido. Nós estamos sendo invadidos! Eu como moradora, estou me sentindo invadida, desrespeitada”. Para Rose os danos ambientais são os mais severos para a população. “A gente olhando, a gente vê que não é a mesma Antônio Pereira, que a gente viu lá atrás. A Vale tem uma dívida e está na hora de ela quitar essa dívida com a comunidade!”
Silezia Gomes Dias é moradora de Antônio Pereira desde 1981 e relatou durante a reunião o carinho que tem com a comunidade, além de evidenciar a transformação que a mineração vem causando no local. “A gente era feliz e não sabia. Até o Vale chegar e começar a empurrar a gente. Não temos mais sossego pra nada. Temos só poeira”. Ela denuncia os riscos que as crianças do distrito vem sofrendo em razão do trânsito de carros da mineração no entorno da escola. “Agora muitos carros da Vale estão cortando caminho na parte da manhã, a ponto de atropelar crianças na porta da escola. A Vale deveria olhar isso. É perigoso. É muita criança!”
Morador da Projetada 15, Waltuir Ribeiro Mendes Júnior, presente na reunião, se dispôs a compor a comissão para fortalecer a luta coletiva e levar adiante as denúncias próprias de pessoas de sua vizinhança. Ele também relata o carinho que tem com o distrito, mas se indigna com a situação crítica da poeira, que assola toda a comunidade. “Lá onde que nós moramos, na projetada 15, com o vertedouro é caminhão pra lá e pra cá, tá um inferno. A poeira, pode lavar o carro hoje, quando é amanhã de manhã você escreve no vidro com o dedo mesmo. É muita poeira”.
Vivendo próximo da Zona de Autossalvamento (ZAS), Waltuir conta que dezenas de familiares tiveram que sair de Antônio Pereira, ele relata também o terror sofrido por toda a vizinhança que convive com o vazio deixado pela ZAS. “Como fica o psicológico? Porque a barragem pode vir. Já que chega lá, por que não vai vir aqui também?”
Lutas e conquistas
O modelo de organização que instaura a comissão fortalece a luta por direitos, pois promove a participação popular no processo judicial de reparação dos danos causados às pessoas atingidas. A comissão é, portanto, um importante espaço de deliberação coletiva.
Criada em 2019, a Comissão de Pessoas Atingidas de Antônio Pereira, ao lado de toda a comunidade, já travou batalhas significativas e já alcançou importantes conquistas. A luta e o alerta da Comissão asseguraram o reconhecimento do risco causado pela Barragem Doutor, construída a montante e, assim, garantiu, por meio de uma Ação Civil Pública Ambiental, que as atividades da barragem fossem suspensas e que ela fosse descaracterizada. Essa, e outras conquistas são apresentadas na cartilha “Organização e luta coletiva”. Acesse, leia e compartilhe essa publicação que é mais uma ferramenta de comunicação popular no enfrentamento à mineração predatória.
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