Na última quinta-feira (27), o Comitê de Compromitentes, composto por representantes do Governo de Minas, pelo Ministério Público Federal (MPF), pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), e pela Defensoria Pública de MG, realizou uma live para tirar dúvidas das pessoas atingidas sobre o edital que irá selecionar a entidade gestora de parte dos recursos do Anexo 1.1.
“Nós temos que esclarecer no primeiro momento que o Termo de Referência traz que toda execução do Anexo 1.1 está relacionada com os danos; é uma medida reparatória dos danos, independentemente dessa questão de poligonal. A única função da poligonal no Termo de Referência foi servir de sugestão preliminar para a formulação de uma proposta pela entidade gestora. Nós temos dois momentos: o momento de escolha da entidade gestora e, após a escolha da entidade gestora, temos o segundo momento que é a criação do Sistema de Governança e a efetiva construção da reparação através dos projetos. Tanto a criação do Sistema de Governança, quanto a construção da reparação através dos projetos, ela vai se dar através do Sistema Participativo, com a participação de todos os atingidos, independentemente de poligonal. Se houver relação com o dano vai haver a possibilidade de participação e de criação do projeto.”
(Ailton Ferreira – Defensor Público do Estado de Minas Gerais)
Além dos esclarecimentos sobre o Termo de Referência, um destaque importante durante o encontro foi sobre o papel do Sistema de Participação na construção da Governança Popular para o Anexo 1.1 como uma forma de garantir a participação das pessoas atingidas.
O Anexo 1.1 diz respeito aos Projetos de Demandas das Comunidades Atingidas para a Bacia do Paraopeba e região da represa de Três Marias, e faz parte do Programa de Reparação Socioeconômica do Acordo Judicial. Nele, está prevista a destinação total de R$ 3 bilhões para projetos de demandas das comunidades, sendo R$ 1 bilhão para linhas de crédito e microcrédito.
Além disso, de acordo com o edital, a entidade que for selecionada irá administrar R$ 300 milhões do Anexo 1.1, sendo obrigada a destinar um terço desse valor em projetos de crédito e microcrédito para pessoas atingidas.
O espaço foi pensado para que as pessoas atingidas tirassem dúvidas sobre o edital, além de compartilharem anseios e preocupações relativos ao processo de reparação. A reunião virtual contou com o apoio das Assessorias Técnicas Independentes da Bacia do Paraopeba e região do Lago de Três Marias (Aedas, Guaicuy e Nacab).
Assista a live na íntegra:
As instituições que compõem o Comitê fazem parte de uma instância de aprovação, validação e decisão de parte dos assuntos relativos à execução das medidas do Acordo. Entre os representantes estavam Shirley Machado, promotora de justiça do Estado de Minas Gerais; Ludmila Oliveira, procuradora da República, representando o Ministério Público Federal; Ailton Ferreira, Defensor Público do Estado de Minas Gerais; e Luís Otávio Milagres, representante do governo de Minas Gerais.
O diálogo sobre o Anexo 1.1, em especial sobre a entidade que fará a gestão de parte dos recursos do anexo, partiu de um pedido das pessoas atingidas. Shirley Machado, promotora de justiça do Estado de Minas Gerais, explica que o anexo em questão faz parte do Acordo Judicial que busca reparação pelos danos coletivos vivenciados pelas comunidades atingidas pelo rompimento da barragem da Vale, ocorrido em janeiro de 2019: “Há uma série de medidas que compõem a Reparação Socioeconômica, por exemplo, o Anexo 1.2, que cria o Programa de Transferência de Renda, e os Anexos 1.3 e 1.4, de fortalecimento de políticas públicas. Agora, o primeiro anexo deste item de reparação socioeconômica é o 1.1, que trata dos Projetos de Demandas das Comunidades Atingidas e é o nosso ponto de diálogo nesta reunião aberta”.
A promotora ainda destaca que, no mês de agosto deste ano, foi realizada uma reunião presencial entre o Comitê de Compromitentes e a população atingida da região 1, sendo dada atenção à necessidade pontuada pelas pessoas atingidas das reuniões serem realizadas presencialmente, incluindo os demais territórios atingidos ao longo da Bacia do Paraopeba.
Em 11 de outubro, as Instituições de Justiça (Ministério Público Federal, Ministério Público de Minas Gerais, e Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais) publicaram edital para seleção de entidade gestora e uma das principais reivindicações das pessoas atingidas é a garantia da participação na gestão dos recursos do Anexo 1.1, como previsto no Acordo.
Ailton Ferreira, Defensor Público do Estado de Minas Gerais, afirma que, durante todo o trabalho da entidade gestora, deverá ser garantida a participação das comunidades: “são as pessoas atingidas que irão participar de todo o processo de concepção de construção dos Projetos de Demandas das Comunidades Atingidas. Esse é um processo que preza pela participação da população, e as Instituições de Justiça não terão nenhum poder nisso. Tudo irá partir das pessoas atingidas com o apoio das Assessorias Técnicas Independentes, se assim vocês quiserem”.
Pessoa atingida: familiares de vítimas fatais terão acesso ao crédito e microcrédito do Anexo 1.1? E os projetos comunitários, podem ser acessados por nós, familiares de vítimas fatais, para serem aplicados em outros municípios?
Compromitentes: sobre o acesso ao crédito e microcrédito a familiares de vítimas fatais: são questões que ainda não haviam sido trazidas para as Instituições de Justiça. A construção de como irá se dar a execução deste anexo, como serão escolhidos os projetos e as comunidades beneficiadas, isso tudo virá em outro momento, mas é uma pergunta muito importante para reflexão.
Pessoa atingida: estão sendo considerados a experiência de trabalho junto a familiares de vítimas fatais como critério de escolha da entidade gestora?
Compromitentes: Sim. A entidade precisa apresentar uma série de documentos para comprovar às Instituições de Justiça se ela tem condições de executar um projeto tão complexo e amplo, como o Anexo 1.1. Por isso, uma série de requisitos precisam ser cumpridos, relacionados ao trabalho com pessoas atingidas por barragens, com sobreviventes de desastres, em projetos relacionados com a defesa de direitos humanos, por exemplo. Há um amplo pedido de requisitos institucionais que a entidade deve apresentar e será considerado para verificar qual é a mais apta, principalmente pensando na experiência de trabalho em todos esses temas.
Pessoa atingida: qual o motivo das poligonais dividirem as comunidades ao meio, em que parte recebe e outra não? Isso acontecia no antigo Pagamento Emergencial em que vizinhos ficavam contra vizinhos. Qual garantia temos que todas as comunidades da R5 serão contempladas?
Compromitentes: o que está previsto no edital de delimitação territorial, como as poligonais, serve apenas de referência. A entidade gestora irá construir essas delimitações junto das pessoas atingidas. Quais serão as comunidades e quem será atendido será definido posteriormente. O objetivo do 1.1 se relaciona aos danos sofridos pelas coletividades, por isso, se há elementos que determinam que uma comunidade sofreu algum dano, a proposta será ligada a esses danos que tem que ser reparados.
Pessoa atingida: entendemos que deve haver a defesa das especificidades dos Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) no processo de reparação. Precisamos de garantias que estaremos inseridos dentro de todo o anexo do acordo e, no anexo 1.1, precisamos estar presentes nos mecanismos de decisão. A entidade gestora será capacitada para atender os PCTs? Serão observados os pontos de fragilidade de acesso e limitação de tecnologia nas comunidades tradicionais que, geralmente, estão localizadas em zona rural. Haverá verba específica para PCTs nas propostas de crédito e microcrédito?
Compromitentes: as Instituições de Justiça têm como uma das missões constitucionais garantir a defesa dos Povos e Comunidades Tradicionais, tanto que está previsto no edital essa obrigação da entidade gestora. Para o Sistema Participativo que a entidade gestora vai criar e de governança dos recursos, um dos requisitos é garantir a escuta dos Povos e Comunidades Tradicionais, levando em conta as peculiaridades das comunidades que vocês levantaram. Nós não fizemos uma consulta prévia, livre e informada para o edital porque ele é um ato genérico e está valendo para escolha da entidade gestora, não é algo que está sendo só para os PCTs. No sistema de governança e participação que vai ser apresentado por essa entidade gestora num momento posterior, estará previsto essa participação, e quando houver algum projeto que tenha alguma incidência específica em alguma Comunidade Tradicional, ela vai ser previamente consultada de forma livre e informada.
Lembrando mais uma vez que aquele recorte territorial que está no edital é apenas uma referência inicial, o que é importante, e tem que ser lembrado, é que esse recurso se destina a uma reparação de danos coletivos. As coletividades que forem indicados que foi identificado que houveram danos causados por esse desastre crime tem que tá previsto na proposta da entidade gestora que os recursos vão ser destinados também a essas comunidades…quem vão ser a comunidades elegíveis será num momento posterior e tem que ter a participação de vocês…quem vai nos dizer vai ser as pessoas atingidas.
Pessoa atingida: No Anexo 1.1, nos termos de referência, as Comunidades Tradicionais não são citadas. Ficamos em dúvida, enquanto Povo Kaxixó, se seremos incluídos e se a unidade gestora terá um departamento para atender as Comunidades Tradicionais.
Compromitentes: não citamos nenhuma comunidade, apenas PCTs em geral. Acreditamos que todos estão incluídos na denominação, inclusive os indígenas, então sim, está previsto no edital de seleção da entidade que é preciso considerar todas as comunidades tradicionais.
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