Na última quarta-feira (2/10), atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão e movimentos sociais se manifestaram em frente ao Fórum de Mariana pela manutenção do direito à Assessoria Técnica Independente
Após vários cortes orçamentários que colocam em dúvida a permanência da Assessoria Técnica Independente prestada pela Cáritas MG|ATI Mariana aos atingidos pelo rompimento da Barragem Fundão, a última quarta-feira (2/10) foi mais um dia de luta e manifestação pela manutenção do direito à ATI no território. Há quase nove anos as pessoas atingidas pelo maior crime-desastre socioambiental da história do país sofrem com os danos causados pelas empresas Samarco, Vale e a mineradora anglo-australiana BHP.
A decisão se a ATI permanecerá no território já esteve no âmbito da Justiça Federal e, em abril deste ano, retornou para deliberação pela juíza Fernanda Rodrigues Mascarenhas, da 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais da Comarca de Mariana.
Por isso, na quarta-feira, pessoas atingidas pela Barragem de Fundão e movimentos sociais estiveram presentes em frente ao fórum da cidade de Mariana para acompanhar a audiência entre a juíza, representantes do Ministério Público, representantes da Cáritas MG e das empresas responsáveis pelo rompimento. O objetivo da reunião foi apresentar os Planos de Trabalho das partes envolvidas para que a juíza possa decidir se a ATI permanecerá no território.
Durante a audiência, as empresas rés, por meio da Fundação Renova, apresentaram um plano diferente da proposta da ATI, baseado na atuação emergencial e reduzida da assessoria para atuação perante a instabilidade quanto à permanência no território. No entanto, o entendimento do Ministério Público de Minas Gerais é que o Plano de Trabalho aceito deva ser o da ATI com o objetivo de atender às necessidades das pessoas atingidas de forma integral.
“O que aconteceu na quarta foi uma tentativa de conciliação. A pauta da audiência foi centrada nos Planos de Trabalho. Tentou-se chegar a um consenso em relação a valores. De acordo com o que a gente já tinha sinalizado para o Ministério Público, ele entendeu que o Plano de Trabalho da Cáritas é muito razoável e que ele não estava disposto a abrir mão de nada, que estava entendendo que o plano apresentado é o mínimo que pode ser oferecido em termos de ATI, e esse direito não pode ser oferecido de forma não integral. Então, prestamos alguns esclarecimentos solicitados pela juíza em relação ao nosso Plano de Trabalho. Agora, no prazo de 10 dias úteis, precisaremos entregar alguns documentos que foram solicitados pelo MP, e as empresas também, para que a juíza possa decidir”, explica Marisa Versiani, coordenadora operacional da Cáritas MG|ATI Mariana.
Enquanto a reunião acontecia dentro do Fórum, as pessoas atingidas reivindicaram seus direitos, do lado de fora do prédio, com cartazes, posts nas redes sociais e apoio de assessores técnicos independentes que atuam na região de Mariana e Ouro Preto.
“A importância da gente estar aqui é porque a gente corre o risco de perder a Assessoria Técnica. Há nove anos a gente está lutando em um processo em que a reparação não conseguiu atingir os objetivos. As pessoas não conseguiram retomar sua vida de volta. Tem muita coisa pela frente para poder ser resolvido e para a gente conquistar. E o trabalho da assessoria é fundamental. A gente não tem embasamento técnico para debater certas questões. Então, cortar a assessoria dos atingidos é promover injustiça”, advertiu Marino D’Ângelo Júnior, morador atingido de Paracatu de Cima, integrante da Comissão de Pessoas Atingidas pela Barragem de Fundão (CABF), representando as comunidades da zona rural.
Evidenciando que as pessoas atingidas ainda têm muito pelo que lutar, Mônica dos Santos, atingida na comunidade Bento Rodrigues e integrante da CABF, conta sobre os problemas enfrentados diante da entrega das chaves do reassentamento construído como medida reparatória.
O reassentamento citado por Mônica começou a ser entregue à população atingida em 2023, incompleto e com problemas estruturais no imóveis. Além disso, a nova área construída não preserva características da comunidade de origem, inundada pela lama, o que dificulta o sentimento de pertencimento por parte dos moradores.
“As famílias que já estão morando no reassentamento (Novo Bento), estão passando por vários problemas. Não é com a simples entrega da chave que nossos problemas estão resolvidos, muito pelo contrário, eles têm surgido com mais frequência, e as famílias têm acionado mais assessoria. Eu acho que a Cáritas tem que ficar no território enquanto existir mineração, porque a comunidade de Bento não construída em área de risco, foi a mineração que foi pra perto da gente. Além disso, quando o reassentamento começou a ser construído, não havia mineradoras na região. Agora, a empresa Cedro já está começando a se instalar por lá.”
Durante o ato, Letícia Oliveira, da Coordenação Nacional do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), destacou que o direito à Assessoria Técnica Independente é garantido em lei, na Política Nacional dos Atingidos por Barragens. Segundo ela, o grande desafio é fazer com que esse direito aconteça de fato na realidade dos atingidos, sem descontinuidades. “Nós estamos vivendo um momento em que a assessoria já sofreu vários cortes.”
Quem também prestou solidariedade às pessoas atingidas e à ATI Cáritas foi Ronald Guerra, vice-presidente do Guaicuy e coordenador-geral da ATI Antônio Pereira. “Nós viemos aqui em solidariedade a todas as pessoas atingidas, a própria Assessoria Técnica Independente da Cáritas, buscando também fortalecer o movimento de garantia para que todas as pessoas atingidas por rompimentos ou atingidas por processos de descomissionamento de barragem tenham o direito à Assessoria Técnica Independente.”
Por Mariana Viana
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