De acordo relatório da ANM, Minas Gerais possui 25 das 31 barragens embargadas por falta de declaração de estabilidade; 18 são da mineradora Vale
A notícia de que a barragem da Mina de Fábrica Nova, administrada pela Vale no distrito marianense de Santa Rita Durão, estava interditada pela Agência Nacional de Mineração (ANM) por falta de comprovação de estabilidade das pilhas de material estéril (pilhas de rejeito), localizadas acima de um dique de sedimentos e água, potencializou os danos já sofridos pelas pessoas atingidas por barragens nas cidades mineiras de Mariana e Ouro Preto.
Nesta semana, o Guaicuy, que presta Assessoria Técnica Independente à população do distrito de Antônio Pereira, atingido pelas obras de descomissionamento da Barragem Doutor, da mineradora Vale, recebeu mensagens dos moradores do local que estão preocupados com os impactos que um possível rompimento na barragem de Fábrica Nova possa causar no distrito.
“Sobre esse assunto de Santa Rita Durão, dessa barragem que está para acontecer mais uma tragédia, é essa barragem que vai ‘deslamar’, como se diz, aqui na Barragem do Doutor? A água vem na Barragem Natividade? É essa mesma? Porque, se for, a gente também está correndo muito risco. Pelo que entendi é isso: se acontecer alguma coisa, ela cai na Barragem de Natividade e do Doutor? Ela atinge as duas?”, questiona uma moradora de Antônio Pereira, que prefere não ser identificada.
Apesar da proximidade entre Santa Rita Durão e Antônio Pereira, apenas 30km, não há indícios que um rompimento em Fábrica Nova afetaria o distrito de Ouro Preto, pois a barragem de Antônio Pereira tem incidência sobre o Rio Gualaxo; já a mina de Fábrica Nova está na divisa entre as bacias dos rios Piracicaba e Piranga.
No entanto, após 8 anos do rompimento da Barragem de Fundão, considerado o maior crime ambiental do país e que matou 19 pessoas, e 4 anos do rompimento da Barragem de Brumadinho, que provocou 272 mortes e danos ao longo de toda Bacia do Rio Paraopeba, é impossível limitar a classificação os danos causados pela mineradora Vale apenas no aspecto geográfico. O que há na região de Mariana e Ouro Preto é um acúmulo de medo, dano à saúde mental e insegurança quanto à estabilidade das barragens que ainda estão em funcionamento.
Uma prova disso é que, mesmo com uma nova vistoria realizada pela ANM, no final da segunda-feira (13/11), onde se constatou que não há risco iminente de rompimento em Fábrica Nova, a população ainda busca por informações precisas. Confira a nota da ANM.
O medo potencializado da população se justifica pela situação alarmante de insegurança das barragens no estado. A construção de Fábrica Nova não é exceção: no último relatório da ANM, divulgado em setembro de 2023, Minas Gerais possui 25 das 31 barragens embargadas por não apresentarem declaração de estabilidade; 18 são da mineradora Vale, e a Barragem de Doutor é uma delas.
Segunda-feira (13/11), a notícia sobre o risco de rompimento na Barragem de Fábrica Nova ganhou repercussão local e nacional. As informações são que, no dia 10 de novembro, a Agência Nacional de Mineração (ANM) interditou e suspendeu as atividades em três pilhas de material estéril (PDE Permanente I, PDE Permanente II e PDE União Vertente Santa Rita) por causa da falta de comprovação de segurança. As pilhas de material estéril são constituídas por rejeitos da extração do minério e o risco apontado pela ANM seria o desabamento dessas pilhas no dique PDE Permanente I de 6,7m de altura e com capacidade de 62.000m³, construído a jusante (abaixo). Ainda que o dique tenha dimensão menor do que uma barragem, os efeitos de um possível transbordamento seriam bastante nocivos, como ocorrido com a Mina Pau Branco em janeiro do ano passado. Localizada em Nova Lima, a mina é controlada pelo Grupo Vallourec e seu transbordamento interditou a BR-040, deixou uma pessoa ferida, causou a remoção de pessoas da região, afetou duas unidades de conservação do IBAMA e atingiu a Bacia do Rio das Velhas.
O número de pessoas impactadas por um possível rompimento na Mina de Fábrica Nova é de 295, localizadas na Zona de Autossalvamento (ZAS) da barragem. Além disso, as pessoas do distrito de Santa Rita Durão teriam apenas 30 minutos para saírem de suas casas e buscarem um lugar seguro.
De acordo com informações da ANM, após vistoria realizada no local, não foi constatada “anomalia aparente que apresente risco iminente” de rompimento. O trabalho de fiscalização teve continuidade terça-feira, dia 14 de novembro. A ANM afirmou ainda que “em parceria com a Defesa Civil Estadual e do município de Mariana, Ministério Público, Fundação Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais (Feam), Corpo de Bombeiro e a Associação dos Moradores da Associação Santa Rita, reuniu-se ainda com representantes da Vale para esclarecimentos.”
Durante o encontro, a mineradora apresentou um estudo preliminar onde afirma que não há risco iminente de ruptura. “Mesmo assim, diante das condições atuais do reservatório e de contorno conservadoras do estudo de ruptura hipotética, técnicos da Vale entendem que os impactos de uma eventual ruptura, considerando essa condição de falha, são irrelevantes na área a jusante.”
Por Júlia Zuza e Mariana Viana
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