Instituto Guaicuy

Pessoas atingidas de toda Bacia do Paraopeba e Três Marias se encontram para debater participação no processo de reparação

13 de junho, 2022, por Comunicação Guaicuy

Encontro de Atingidas e Atingidos da Bacia do Paraopeba e Três Marias (11 e 12) reuniu representantes de 20 municípios

“Aqui que a gente viu que nós, atingidos, falamos a mesma língua, de Brumadinho a Três Marias”. Com essas palavras, Jéssica Camila de Oliveira Gonçalves , moradora de Betim, resumiu o Encontro de Atingidas e Atingidos da Bacia do Paraopeba e Três Marias. O evento aconteceu em Belo Horizonte, no sábado e domingo (11 e 12), e reuniu cerca de 150 representantes das comunidades atingidas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. 

Imagem de Bárbara Ferreira/NACAB

“Passamos mais de dois anos de pandemia com esse desafio histórico de construir uma governança popular de maneira virtual. Com pessoas ribeirinhas, povos indígenas, etc. que não têm acesso à internet, e isso fragilizou muito o processo de participação. Nos últimos meses, conseguimos fazer uma série de reuniões presenciais e agora conseguimos coroar esse processo com esse encontro que possibilita que as pessoas de todas as áreas olhem nos olhos umas das outras e se reconheçam como pessoas atingidas” – Fábio Garrido, Instituto Guaicuy

A união das pessoas de todas as Áreas atingidas e a construção da Governança Popular do Anexo 1.1: e de um Sistema de Participação foram os objetivos centrais do evento. Para Oraida Santos Oliveira, que vive na comunidade de São Sebastião da Aldeia (Abaeté), o encontro foi uma oportunidade de conhecer pessoalmente as pessoas que, até então, conversava apenas pela internet: “Foram experiências novas e muita aprendizagem, uma oportunidade de conhecer as perdas das pessoas [de outras regiões]. Todo mundo foi atingido, cada um da sua forma”. 

Multiplicadores

Com organização das três Assessorias Técnicas Independentes (ATI’s), Instituto Guaicuy, Aedas e NACAB, o Encontro foi um importante marco na luta pela reparação integral e construção da participação popular. 

Encontro de Atingidas e Atingidos da Bacia do Paraopeba e Três Marias aconteceu em Belo Horizonte. Imagem de Daniela Paoliello/Guaicuy

Os participantes foram divididos aleatoriamente entre Grupos de Trabalho que foram formados para debater a Gestão Popular dos Projetos das Comunidades (Anexo 1.1) e a criação de um Sistema de Participação que abarque os pontos comuns e as particularidades de todas as regiões.  

Os debates serviram como base para o primeiro esboço do Sistema de Participação, que foi lido na plenária final e será aprimorado ao longo dos próximos meses, num trabalho conjunto entre ATI’s e comunidades atingidas. “Eu quero reforçar a união da Bacia, que a gente saia daqui como multiplicadores e que a gente leve para a base tudo que a gente aprendeu e construiu aqui e que a base também tenha direito em opinar na construção do Sistema de Participação”, defendeu Tatiane Menezes, moradora do Projeto de Assentamento Queima Fogo, em Pompéu. 

O encontro teve início com uma mística, que simbolizou a limpeza da lama do Rio Paraopeba e reuniu as pessoas atingidas com músicas e descontração. O evento foi fechado com a lembrança de que “o Rio ainda corre, o povo ainda luta”. 

Como foi o Encontro de Atingidas e Atingidos da Bacia do Paraopeba e Três Marias

No sábado de manhã, a Plenária de Abertura contou com a presença das três ATIs e também de convidados: entre eles, representantes de cada uma das cinco regiões da bacia, de povos e comunidades tradicionais atingidos pelo rompimento, da Coordenação de Acompanhamento Metodológico Finalístico (CAMF-PUCMG), da Associação de Familiares de Vítimas de Brumadinho (AVABRUM), da Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (RENSER), do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) e do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

Pessoas atingidas pelo rompimento da Barragem da Vale  levam informativos impressos produzidos pelas ATI's
Informativos impressos desenvolvidos pelas ATI’S foram disponibilizados durante o evento. Imagem de Daniela Paoliello/Guaicuy

O minuto de silêncio em homenagem às 272 vítimas do crime-desastre da Vale emocionou todos os presentes e foi seguido por uma dura fala de Josiane Melo, da AVABRUM, que cobrou justiça e celeridade. “A impunidade consolida o crime e corrói nossas almas”, afirmou, lembrando de sua irmã grávida falecida no rompimento.

Anexo 1.1

Após o almoço, as discussões foram retomadas no sábado com uma mesa sobre a Gestão Popular dos Projetos das Comunidades. Os projetos estão previstos no Anexo 1.1 do Acordo assinado entre Vale e Poder Público. No Acordo, são destinados 2 bilhões de reais para os projetos comunitários e 1 bilhão de reais para linhas de crédito e microcrédito para pessoas atingidas. É previsto que a execução, gestão e finalização do Anexo 1.1 seja realizada pelas pessoas atingidas e como fazê-lo foi, justamente, o assunto da discussão. 

Antes de iniciar os debates, foram lembrados todos os acúmulos construídos sobre o tema entre as comunidades atingidas e as ATIs. Segundo Leila Regina, do NACAB, foram realizadas 108 reuniões em toda a bacia, que reuniram mais de 2 mil pessoas. A sistematização dessas atividades apontou que as pessoas atingidas querem fundamentalmente que haja ‘participação efetiva nas decisões’ e ‘tempo garantido para os debates’. 

Janderson Santana, da Aedas, apontou os princípios desejados pelas comunidades atingidas para a Gestão Popular desses projetos. Entre eles: protagonismo, autonomia, transparência, controle social, amplitude territorial, mobilização, autossustentabilidade, integração, união, reconhecimento, equidade, qualidade e celeridade. 

Fábio Garrido, assessor do Instituto Guaicuy, aprofundou as discussões sobre o sistema de participação, lembrando que, sem ele, não há governança popular dos recursos. O objetivo do plano participativo é garantir que os projetos das comunidades alcancem a reparação de danos. 

Ciranda

Durante todo o encontro foi organizado o espaço de Ciranda, que reuniu 21 crianças e adolescentes com atividades lúdicas e de debates. A Ciranda é um espaço fundamental em eventos como esse, pois garante a participação efetiva das mães no encontro, ao mesmo tempo em que permite também a participação dos próprios jovens em espaços que misturam lazer e debates.

Encerramento

No domingo ainda cedo, os encaminhamentos e conversas do dia anterior foram retomados em plenária para que os participantes pudessem voltar a se reunirem nos Grupos de Trabalho iniciados no dia anterior e continuarem as conversas sobre Governança Popular e construção do Sistema de Participação. Enquanto isso, as crianças mais uma vez se reuniram em brincadeiras e conversas lúdicas sobre participação e sobre como suas vidas são afetadas pelo rompimento. 

Nos GTs, os debates giraram em torno de estratégias para difundir as informações do processo judicial, do Acordo entre Vale e Poder público e das ações de reparação. As sugestões mais citadas nos debates foram sistematizadas no escopo do Sistema de Participação, que foi apresentado a todos no final da manhã, na plenária de encerramento.

Grupos de Trabalho debateram estratrégias de participação popular. Imagem de Camila Bastos/Guaicuy

Este momento começou com participação das crianças e adolescentes, que levaram cartazes com algumas palavras e demandas que guiaram as discussões do final de semana. O Escopo do Sistema de Participação foi apresentado por duas pessoas atingidas, seguido pela apresentação da sistematização dos debates. Mais uma vez, os participantes puderam fazer considerações sobre o texto e apresentar sugestões de mudanças ou inclusões.

Veja as fotos do Encontro de Atingidas e Atingidos da Bacia do Paraopeba e Três Marias. As imagens são de Bárbara Ferreira/NACAB e uma imagem é de Daniela Paoliello/Guaicuy.

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