Encontro virtual teve participação de pessoas impactadas com os crimes de mineração que aconteceram nos últimos anos em Minas Gerais
A luta por uma vida digna nunca foi fácil. Pessoas que vivem à margem de rios, trabalham com a pesca, com a terra, com a agricultura. Povos e comunidades originárias e tradicionais. Todos sempre precisaram lutar para garantir o prato de comida na mesa, um lugar para morar e a água de qualidade para beber. Porém, após os rompimentos das barragens, essa força tem que ser ainda maior.
Para discutir os impactos trazidos pelos rompimentos de barragens da Vale que atingiram o Rio Doce e o Paraopeba nos últimos anos, pessoas atingidas participaram de um encontro virtual. A live aconteceu no último sábado, dia 24 de abril, e contou com diversas colaborações especiais.
Os convidados foram:
Dulcilene Pinto – Pescadora em Felixlândia, MG.
Jonas Veloso – Advogado popular do Instituto Guaicuy
Luiz Bigú – Assessor jurídico da Federação Estadual de Pescadores e Pescadoras – Três Marias, MG.
Lélis Barreiros – Pescador atingido, Presidente da ASPEC e Presidente da Colônia Z43 – Conselheiro Pena, MG.
Marcus Polignano – Direção do Instituto Guaicuy e Manuelzão
Maria Célia – produtora rural e membro da comissão atingidos Conselheiro Pena, MG.
Vanessa Gaudereto – Representante do Instituto Guaicuy.
Além dos convidados, também participaram do encontro o mediador Filipe Ribeiro e outros colaboradores do Guaicuy.
Veja a seguir o vídeo com o encontro virtual completo!
O evento se iniciou com a fala do professor Marcus Vinícius Polignano que abriu o debate junto aos pescadores e pescadoras das regiões atingidas. “A gente já conhece um pouco da realidade, da história desses territórios. Tivemos o crime do Rio Doce com quase 60 milhões de metros cúbicos de rejeito que estão lá no rio até hoje. E depois a situação de Brumadinho em 2019”, descreve o diretor do Instituto Guaicuy.
A partir da fala de abertura, os demais convidados entraram no debate. O primeiro a comentar foi o advogado popular, Jonas Veloso. Ele conversou sobre a importância que é o fato de as pessoas atingidas participarem de todos os processos das assessorias técnicas independentes. Já que são elas que sabem os verdadeiros impactos trazidos pelos rompimentos das barragens.
Em seguida, Luiz Bigú iniciou as falas dos representantes dos pescadores e pescadoras. Ele, que é profissional na área do Lago de Três Marias, também atingido pelo crime da Vale em Brumadinho, trouxe um histórico de problemas causados por grandes empreendimentos. “Nós representamos mais de 30 mil pescadores e estamos na luta para tentar melhorar a qualidade de vida desses profissionais”, afirma o assessor jurídico.
A pescadora de Felixlândia, em torno do Lago de Três Marias, Dulcilene Pinto, disse que trabalha com pesca por mais de 17 anos. Para ela, é muito triste toda essa situação trazida pelo rompimento da barragem. Principalmente para quem vive do peixe, que passa por diversos problemas desde então. “É um dano irreparável. Nosso rio era farto de peixe. A gente tinha turismo, a gente tinha tudo, agora não tem mais nada. Eles acham que podem destruir tudo e sequer dão assistência a quem foi prejudicado”, revela a profissional.
A quantidade de peixe que antes pescava e vendia caiu bastante e o mau cheiro do rio incomoda. Dulci relata que até atividades de lazer, como entrar no rio, tomar um banho, não pode fazer mais. “Que justiça seja feita! Isso não pode e não vai ficar impune”, retoma.
Além das falas da Dulcilene Pinto e do Luiz Bigú que atuam nas áreas atingidas do Paraopeba, o encontro também contou com representantes de pescadores e produtores do Rio Doce.
O crime, que aconteceu em novembro de 2015, segue sem solução. O Rio Doce continua contaminado, os moradores de Bento Rodrigues ainda não têm onde morar e as comunidades ribeirinhas sofrem com a falta de água de qualidade.
O pescador de Conselheiro Pena, MG, Lélis Barreiros, reivindica que os ribeirinhos são sim povos tradicionais, mas não são reconhecidos desse modo. Por conta disso, enfrentam vários problemas para conseguirem sobreviver sem os direitos que são negados pelos órgãos governamentais. “A gente está sendo penalizado pelo crime da Samarco/BHP no Rio Doce. Nós não conseguimos nem tirar os documentos necessários para poder pescar. Eu precisei sair do Brasil para conseguir me sustentar. Estamos sendo punidos o tempo todo. Isso é muito triste”, destaca o trabalhador.
A produtora rural, Maria Célia, complementou as falas anteriores ao destacar que os que vivem da terra também dependem de uma água de qualidade, não apenas quem trabalha com a pesca. “Nós, produtores rurais, além de dependermos das águas do rio, a gente depende do solo. Veio a lama, o rejeito caiu no rio. Aí, depois, veio a cheia e jogou essa lama toda nas nossas terras. As empresas gastam muito dinheiro para tentar provar que estão certas, em vez de gastar um pouco com a gente e tentar consertar o que estragaram”, cobra a atingida.
A representante do Guaicuy, Vanessa Gaudereto, trouxe algumas informações importantes sobre o cenário da pesca nas áreas atendidas pela instituição (4 e 5 da bacia do Paraopeba e Lago de Três Marias).
A analista trouxe dados sobre os tipos de pesca que existem e como elas ocorrem nas regiões atingidas e/ou prejudicadas. Ela também mostrou decretos, leis, normas e órgãos públicos que impactam na vida dos pescadores e pescadoras brasileiros.
Gaudereto ainda elencou quais foram as mudanças trazidas pelo rompimento e de que forma os atingidos e prejudicados podem buscar a reparação integral. Para finalizar, a representante do Guaicuy mostrou vários produtos que são criados a partir da pesca, como é o caso dos artesanatos feitos com o couro da tilápia.
O encontro terminou com uma fala final do professor Polignano que agradeceu a presença de todas e todos que participaram do debate.
A live teve também muita participação no chat e mais de 400 pessoas assistiram ao encontro. Afinal de contas, como disse a produtora rural, Maria Celia, “sem luta não há vitória”.
O que você achou deste conteúdo?