Na manhã desta quarta-feira (6), o juiz Murilo Silvio de Abreu suspendeu a sua própria decisão, de 15 de março de 2023, que definia um caminho para a resolução das indenizações individuais das pessoas atingidas pelo desastre-crime da Vale dentro do processo coletivo.
A Vale havia recorrido, em 14 de abril de 2023, ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) contra essa decisão, afirmando que tinha sido violado o princípio do contraditório, já que a empresa não teria sido previamente consultada para se manifestar sobre ela. A mineradora também contestou a validade da decisão sobre a resolução coletiva das indenizações individuais.
Com a suspensão da decisão pelo próprio juiz de primeira instância, é possível que o relator desembargador André Leite Praça entenda que o recurso ficou prejudicado. Isso significaria que o tribunal não se pronunciaria mais a respeito dele. No entanto, o TJMG até o momento não cancelou formalmente a sessão de julgamento do próximo dia 14.
O entendimento de que o recurso ficou prejudicado por perda de objeto pode ser formalizado nos autos (por escrito) antes da data, ou apenas durante a própria sessão. O julgamento pode ser mantido caso o relator entenda que a retratação do juiz Murilo Silvio de Abreu não foi o suficiente, e que ainda resta alguma questão do recurso da Vale para ser julgada.
No documento publicado hoje, o juiz Murilo Silvio de Abreu não trata do mérito da questão em si, ou seja, não julga se é correta a resolução coletiva das indenizações individuais. A decisão pode ser entendida como um recuo que visa resolver eventuais erros que levaram a mineradora a entrar com o recurso na segunda instância e que poderiam prolongar por mais tempo a discussão de questões formais, adiando muito a discussão da questão.
Apesar de reafirmar que a Vale tinha se manifestado nos autos, Murilo alegou que decidiu revogar a decisão para “possibilitar uma construção conjunta, adequada e célere para o tratamento dos direitos individuais dos atingidos”. Com isso, intimou a mineradora a se manifestar, em até 10 dias, sobre o pedido de resolução coletiva das indenizações individuais feito pela Instituições de Justiça.
Como os três desembargadores da 19ª Câmara Cível do TJMG tratariam sobre o recurso da Vale contra a decisão hoje revogada, existe a possibilidade, ainda não confirmada, de que o julgamento não aconteça mais, ou que trate apenas de questões formais, como declarar a perda de sentido da pauta.
Pedro Andrade, advogado do Instituto Guaicuy, avalia que “a reconsideração da decisão pelo juiz do processo não significa, necessariamente, que a liquidação dos danos individuais não será iniciada. O Dr. Murilo de Abreu somente adiou a questão, para dar oportunidade à Vale de se manifestar e apresentar argumentos e, assim, evitar qualquer irregularidade no processo. No entanto, após a manifestação da Vale, o juiz possivelmente retomará a questão das indenizações individuais, então seria uma suspensão somente temporária”, comentou.
Entenda o caso
Diversos grupos de pessoas atingidas, de Brumadinho a Três Marias, têm defendido a definição de uma solução coletiva para as indenizações individuais. Tal posição foi apresentada, ainda em 2022, pelas Instituições de Justiça (IJs) envolvidas – Ministério Público de Minas Gerais, Ministério Público Federal e Defensoria Pública de Minas Gerais.
A proposta é que o Comitê Técnico Científico (CTC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) realize uma perícia que determine pontos como: quais são os danos; quem deve ser indenizado; as formas e critérios de comprovação; e quais seriam os valores das indenizações. As IJs solicitaram, também ,que as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) que atuam no caso Paraopeba (Instituto Guaicuy, Aedas e Nacab) fossem nomeadas como assistentes técnicas de perícia, para poderem levar elementos já levantados durante os trabalhos das Assessorias, em especial o estudo e mapeamento de danos individuais
O juiz Murilo Silvio de Abreu havia acatado a proposta em março de 2023. Essa é a decisão que ele mesmo revogou nesta quarta-feira. Após recurso da Vale, a Defensoria Pública mudou sua posição e se manifestou de forma contrária na segunda instância. Em seguida, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) se manifestou pela defesa da solução coletiva e foi acompanhado pela Procuradoria Geral de Justiça (PGJ).
Parabéns! Vcs seguindo lado a lado com os atingidos.