Centenas de pessoas atingidas pelo desastre-crime da Vale se reuniram nesta terça-feira (26) em Belo Horizonte para reivindicar a garantia da via do processo coletivo, com direito à nova perícia, na resolução coletiva das indenizações individuais. Estiveram presentes pessoas atingidas de toda a bacia do Paraopeba, da Represa de Três Marias e de comunidades de São Gonçalo do Abaeté e Três Marias banhadas pelo Rio São Francisco.
Enquanto o juiz Murilo Silvio de Abreu recebia representantes das 5 regiões afetadas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, os demais manifestantes enfrentaram o forte calor e o clima seco para se manifestar na rua, exigindo a reparação integral dos danos causados pela mineradora.
Desde o início da manhã, a capital mineira recebeu diversos ônibus, que trouxeram pessoas atingidas para a manifestação em frente ao Fórum Cível e Fazendário, na avenida Raja Gabaglia. Com faixas, cartazes e palavras de ordem, os manifestantes lembravam da demora para resolver os prejuízos causados pelo desastre-crime, quase 5 anos depois do rompimento da barragem.
Lázara Juliana, da comunidade atingida de La Poveda (Felixlândia, Região 5), foi uma das pessoas atingidas que usou o microfone para demonstrar seu descontentamento com o processo de reparação. “Eu vi mortandade de peixes, vários peixes mortos. Vi vizinhas que vivem da agricultura, que pararam porque não conseguem produzir. E a Vale está aí, distribuindo dinheiro [para os acionistas]. Eu costumo dizer o seguinte: é um bolo grande de aniversário, que está sendo distribuído em massa. E todo mundo está comendo um pedaço, menos a gente [pessoas atingidas]”, criticou.
A principal reivindicação do ato foi a resolução coletiva da indenização dos danos individuais, que já tinha sido estabelecida em uma decisão judicial que foi suspensa após um recurso da Vale. As pessoas atingidas também se manifestaram exigindo a aprovação pelas Instituições de Justiça (IJs) dos Planos de Trabalho das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) para acompanhamento do processo judicial.
A pedido do Movimentos dos Atingidos por Barragens (MAB), o juiz Murilo Silvio de Abreu recebeu pessoas atingidas de todas as regiões atingidas pelo desastre-crime da Vale. Também participaram da conversa representantes das ATIs. Murilo é o juiz responsável pelo processo que busca definir como se darão as indenizações individuais.
Todas as pessoas atingidas presentes na reunião puderam falar e manifestar ao juiz suas preocupações com a demora no processo de reparação, além de expor os problemas enfrentados nas comunidades atingidas. A transparência na perícia para determinar quais os danos, seus valores e quem deve ser indenizado foi repetidamente requisitada ao juiz, bem como a agilidade na resolução do processo.
O juiz Murilo Silvio de Abreu não se comprometeu a tomar nenhuma decisão, mas, sempre se demonstrando aberto ao diálogo, e a ouvir todas as partes envolvidas no processo judicial, ressaltou que a escuta dos problemas das pessoas atingidas é fundamental para a resolução do processo.
Representantes das pessoas atingidas das Regiões 4 e 5 aproveitaram a ocasião para entregar ao juiz uma carta com reivindicações sobre a resolução das indenizações individuais. Clique aqui para ler a carta.
Ana Clara Amaral, especialista do Instituto Guaicuy em reconhecimento, participou da reunião e avaliou positivamente os rumos da conversa. “Tivemos duas pautas principais: a importância da liquidação coletiva e a importância de aprovar o Plano de Trabalho do Processo [das Assessorias]. Foi unanimidade entre as pessoas atingidas a importância de acelerar, de ter celeridade, para ter uma perícia coletiva dos danos individuais”, disse.
Após a reunião com o juiz e a manifestação em frente ao Fórum, as pessoas atingidas do Paraopeba, Represa de Três Marias e Rio São Francisco se deslocaram até a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Lá estavam centenas de pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana.
As pessoas atingidas da Bacia do Rio Doce também estavam mobilizadas para lutar pela reparação integral dos danos causados pelo desastre-crime da Samarco/Vale/BHP Billiton. Elas também participaram de audiência na Assembleia Legislativa contra a venda das empresas estatais. Foi organizado um almoço conjunto para todas as pessoas atingidas.
Após o almoço, as pessoas atingidas se dividiram para cumprir agendas distintas. Enquanto as pessoas da Bacia do Rio Doce se deslocaram até o Tribunal Regional Federal (TRF) da 6ª Região, as pessoas da Bacia do Paraopeba, Represa de Três Marias e Rio São Francisco tiveram uma importante reunião sobre o Programa de Transferência de Renda (PTR).
A reunião contou com a presença de duas pessoas atingidas por região, das ATIs e também de Carolina Morishita, da Defensoria Pública de Minas Gerais, e Shirley Machado, do Ministério Público de Minas Gerais. A Fundação Getúlio Vargas (FGV), responsável pela gestão do PTR, também esteve presente.
As pessoas atingidas usaram o espaço de conversa para apontar problemas na execução do PTR. Kléber Castelar, da Comissão de Pessoas Atingidas de Novilha Brava, Campo Alegre e Recanto das Águas (Pompéu, Região 4), criticou a demora na aprovação dos cadastros do PTR. “Ainda faltam 137 pessoas na comunidade. Meu cadastro demorou 1 ano e 2 meses para ser reconhecido. Estou recebendo o quarto pagamento e minha esposa segue aguardando a Poligonal”, disse.
Paula Constante, gestora de projetos de mitigação no Instituto Guaicuy, avaliou que a reunião foi muito importante. “Foi fundamental, em especial para as pessoas atingidas das Regiões 4 e 5, que puderam falar às IJs sobre a realidade territorial, as dificuldades com documentação e sobre a ausência de respostas em relação às notas técnicas de suas comunidades. As pessoas atingidas solicitaram mais transparência em relação ao cadastro nas comunidades e a diminuição da morosidade no cadastro e no georreferenciamento”, afirmou, ressaltando que foram definidos uma série de encaminhamentos na reunião.
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