“Hoje eu sou mãe e pai, eu sou mulher e homem, sou a cabeça da casa. Meus filhos dependem de mim, tenho um filho cadeirante. A gente tá aí na luta, com esperança que dias melhores virão. Estamos lutando nessa guerra contra a Vale. A luta é pra todos, tanto pro homem como pra mulher, só que se você for analisar, as mulheres estão lutando mais, no nosso caso de atingidos, do que os homens”. Esse relato é de Ana Maria Carvalho, moradora da Cachoeira do Choro (Curvelo) e atingida pelo rompimento da barragem da Vale. Mas essa é uma realidade que se repete na rotina de várias mães atingidas.
Seja nos encontros de núcleos e comissões, nas rodas de conversa ou nos acolhimentos realizados pelo Guaicuy em campo, as mães atingidas trazem frequentemente relatos sobre como as demandas da luta pela reparação integral e as responsabilidades de ser mãe se somam e se misturam, assim como com o trabalho da pesca e do plantio e dos afazeres domésticos. “A gente chega cansada do serviço, é menino querendo um trem, querendo outro, é alguma coisa que tem que fazer. Mas a gente dá conta, tem que ser muito forte, a gente é obrigado a dar conta, mas é muito difícil”, desabafa a pescadora Mônica, de Morada Nova de Minas.
A sobrecarga é uma realidade da maioria das mães brasileiras. Em todo o país, mais de 11 milhões de mulheres são chefes de família e as principais responsáveis por sustentar a família, cuidar dos filhos e das tarefas domésticas. No final do ano passado, a pesquisa “Mommy e Saúde Mental”, divulgada pela CNN Brasil, mostrou que 34% das mães realizam sozinhas todas as tarefas da casa e dos filhos.
Quando o assunto é saúde mental, a pesquisa também aponta que 62,7% das mães entrevistadas relatam sensação de vazio, sobrecarga e cansaço. O problema fica ainda mais evidente em situações de risco ou de vulnerabilidade. Durante a pandemia de Covid-19, por exemplo, um levantamento com mais de 800 mulheres conduzido pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) mostrou que mais de 83% delas sentiram sobrecarga em cuidar dos filhos. O estudo ainda destaca que a sobrecarga materna pode intensificar sintomas de ansiedade, depressão e irritabilidade, entre outros.
No caso das comunidades atingidas pelo rompimento da barragem da Vale, o agravamento de diversas questões sociais e a luta pela reparação, trazem, ainda, mais uma camada de responsabilidades e aumenta a lista das tantas tarefas diárias.”Quando eu precisei ir pra Belo Horizonte há pouco tempo, eu precisei deixar para trás duas das minhas netas, porque eu tenho quatro. Eu precisei ter muita coragem, de entrar naquele ônibus só com dois e saber que dois ficaram aqui, sem o meu cuidado. Mãe é igual galinha, quer sempre ter ali os pintinhos embaixo da asa”, conta Fernanda Rodrigues da Silva que mora em Silga, distrito de Três Marias.
“A data é uma oportunidade para o Instituto reforçar o respeito a essas mulheres. Reconhecemos e valorizamos todo o esforço das mães atingidas que, além dedicarem seu tempo e suor ao trabalho e ao cuidado com a família, arranjam tempo para se dedicar à luta pela reparação integral e pelo futuro da natureza e do meio ambiente”, afirma Fernanda Oliveira, assessora de reparação do Guaicuy. Fernanda também aproveita a ocasião para homenagear todas as mães trabalhadoras do Instituto.
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