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Mulheres atingidas de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto/MG, são processadas pela Vale por exercerem seu direito à livre manifestação durante protesto realizado em 2021.
Na tarde de terça-feira, dia 4 de fevereiro, mulheres atingidas pela Vale em Antônio Pereira estiveram no banco dos réus durante depoimento de testemunhas. A anomalia jurídica em que a vítima é colocada no lugar de ré foi causada pela própria mineradora. A Vale entrou com um processo contra algumas mulheres que participaram de um protesto, em dezembro de 2021, na BR MG-129 cobrando a efetividade do direito ao assessoramento técnico independente e à reparação dos danos causados pelo risco de rompimento e obras de descaracterização da Barragem Doutor, da mineradora, em Antônio Pereira.
Protesto em dezembro de 2021. Foto: Projeto Manuelzão / UFMG
“A Vale nos processou. Eu tive visita de policiais na minha casa. Outra companheira foi coagida com visita de pessoas na casa dela também e houve outras represálias”, afirma a pastora Sandra Helena de Oliveira, uma das moradoras processadas, que corajosamente completa: “Mas, se ela pensou que ia conseguir nos parar, nos fazer calar, com esses atos dela, ela perdeu. Nós vamos lutar para unir forças e vencer!”
Carla Dayane Moreira Dias, outra atingida processada pela Vale, também demonstra a força das “mulheres guerreiras” de Antônio Pereira, que não se deixam intimidar. “Não é o processo de uma mineradora covarde que vai derrubar uma comunidade, que está em sofrimento, buscando pelos seus direitos”, afirma Carla, que também é integrante da Comissão de Pessoas Atingidas de Antônio Pereira.
A audiência realizada foi de “instrução e julgamento”, como explica o advogado popular Artur Colito, que atua na defesa das mulheres processadas pela Vale. Segundo ele, as testemunhas foram ouvidas sobre a manifestação que ocorreu em 2021, mas também “sobre o dano moral, o constrangimento que as pessoas sofreram com esse lawfare, com essa perseguição jurídico-política, e também com outras atitudes da Vale que, por vezes, criam um clima de hostilidade na região”.
Para o advogado, que integra o Coletivo de Direitos Humanos do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a mineradora usa do sistema de Justiça para se voltar contra defensores de direitos humanos, como as “guerreiras de Antônio Pereira”, pessoas que lutam por uma coletividade e que foram “escolhidas a dedo”. “Muitas pessoas participaram da manifestação, mas poucas pessoas foram processadas e, hoje, a gente está tentando ressaltar as principais contradições do argumento da Vale”, destaca Artur, que completa: “As mineradoras buscam, de alguma maneira, intimidar as pessoas. Desestimular o seu direito à manifestação, a livre organização, a expressão política.”
A professora da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Kathiuça Bertollo, é uma das testemunhas ouvidas na audiência. “Foi a minha primeira vez enquanto testemunha. Eu considero esse um processo inadmissível. É mais uma violência sobre as mulheres lutadoras.” Segundo Kathiuça, que é integrante da Frente Mineira de Luta das Atingidas e dos Atingidos pela Mineração (FLAMa-MG), o argumento da Vale é que o protesto na BR impediu que seus trabalhadores chegassem ao local de trabalho causando prejuízos financeiros. “É um absurdo! A gente sabe das quantias vultosas de lucro que as mineradoras e que a Vale tem”.
Manifestação não é crime, é direito!
Durante a audiência, um grupo se formou em frente ao Fórum de Ouro Preto em solidariedade às mulheres processadas pela Vale e em defesa do direito à livre manifestação. Marcando presença no protesto, Sandra Andreia Faria, moradora de Antônio Pereira, deixa o recado: “Todos temos direito de nos manifestarmos e à liberdade de expressão. Então, ninguém pode tirar isso da gente!”. Essa afirmação é respaldada pelo artigo 5º da Constituição Federal, conhecida como Constituição Cidadã por ampliar direitos sociais, a carta maior do Estado Brasileiro garante a liberdade de expressão e de reuniões pacíficas, o que inclui atos e protestos, de modo que seus participantes estão protegidos pela lei.
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…] IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
[…] XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
Sandra Andreia, que também é integrante da Comissão de Pessoas Atingidas de Antônio Pereira, justifica sua presença no protesto: “Essas mulheres foram para frente, para lutar pela comunidade, por isso que eu vim aqui hoje para dar um apoio para elas, porque elas não foram só por elas, elas foram representando 5 mil habitantes de Antônio Pereira.”
Foto: Léo Souza / Instituto Guaicuy
O protesto diante do fórum foi também um gesto simbólico. Durante o ato, a injustiça foi escancarada, uma vez que mulheres que exerceram seu direito fundamental à livre manifestação estavam como rés de um processo movido pela mineradora responsável pelos dois maiores crimes socioambiental do país: o rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (2015); e o rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (2019).
Mais de 50 pessoas atingidas são processadas por mineradoras
Dados que evidenciam o uso subvertido do sistema de Justiça por mineradoras que cometem crimes socioambientais foram apresentados por Artur Colito. “Hoje já são cerca de 30 processos, envolvendo mais de 50 pessoas atingidas.” De acordo com o advogado popular, a grande maioria das pessoas processadas por mineradoras estavam se manifestando por direitos com fechamento de rodovias e ferrovias ou próximos às minas e barragens de rejeito. “É uma forma de silenciar essas pessoas… e de não lidar com os problemas que a mineração tem causado às comunidades.”
Foto: Léo Souza / Instituto Guaicuy
Fernanda Lage, advogada popular e assessora da deputada Beatriz Cerqueira, também enxerga esses processos contra vítimas da mineração predatória como uma estratégia de silenciamento. “A gente percebe que essa estratégia que a Vale está usando em Antônio Pereira, e também tem utilizado em outros lugares do nosso estado, é mais uma forma de tentar oprimir cada vez mais toda a comunidade.”
Carla Dayane também afirma que todas as pessoas de Antônio Pereira sofrem violações dos direitos à livre manifestação e à luta pela reparação integral. “A luta não é só nossa, não é uma luta pessoal, é uma luta coletiva. A gente tá aqui não só defendendo os nossos direitos e provando a nossa inocência com a acusação da Vale. Nós estamos defendendo o direito de toda a comunidade e também provando a inocência de toda a comunidade”.
O fechamento da BR é uma forma de luta histórica da comunidade de Antônio Pereira, tanto no enfrentamento à mineração predatória quanto em reivindicações relacionadas às políticas sociais públicas. Para a professora Kathiuça, “como a forma de luta é histórica, a repressão e o cerceamento também são”. Ela destaca: “o interesse das mineradoras é de dominar o território, de calar as pessoas que ousam falar a verdade, que não recuam diante de tanto contexto de violência, calúnia, difamação e mentiras que são envolvidas”.
É preciso ter coragem! Nesse sentido, a pastora Sandra deixa um recado para toda a comunidade: ”não fiquem com medo, juntem-se a nós. Vamos lutar juntos. Precisamos a cada dia mais de pessoas com novas ideias, de jovens talentos. Venham, venham para cima. Vamos mostrar para essa gigante que nós somos um povo e que nós chegamos primeiro!”
Estiveram no protesto do dia 4, em apoio às “mulheres guerreiras”, pessoas atingidas de Antônio Pereira, integrantes do MAB e da FLAMa-MG, trabalhadores do Instituto Guaicuy, representante da Câmara dos vereadores e da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, entre outros defensores dos direitos humanos.
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