As Assessorias Técnicas Independentes, que atuam na bacia do rio Paraopeba e região da represa de Três Marias (Guaicuy, NACAB e Aedas) em parceria da Coordenação e Acompanhamento Metodológico e Finalístico (CAMF) da PUC Minas, organizaram um encontro virtual sobre o Anexo I.1. A live “Projetos de demandas das comunidades: Quem decide?” aconteceu na noite de ontem, quarta-feira (13), e contou com a participação de mais de 390 pessoas assistindo a transmissão ao vivo.
O objetivo do encontro foi gerar discussão sobre a importância da participação das pessoas atingidas e de convocar as comunidades a participarem da construção participativa do Plano Popular de Recuperação, Desenvolvimento e Justiça para a Bacia do Paraopeba e Lago de Três Marias. Estiveram presentes também representantes da Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser), do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e pessoas das cinco áreas atingidas (de Brumadinho até a região da Represa de Três Marias).
Carla Wstane, diretora de Projetos do Instituto Guaicuy, iniciou a apresentação reforçando a importância do Anexo 1.1 para as comunidades atingidas. “Queremos lutar por um futuro novo, sem perder a memória e lutando por justiça”. Em memória daqueles que perderam a vida após o rompimento também foi realizado um minuto de silêncio, “nos solidarizamos para que a gente não esqueça todas as injustiças e nem esqueça todas as pessoas”, afirmou a diretora.
Assista a live completa:
Dom Vicente, bispo da Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser), alertou sobre como o rompimento da barragem segue afetando a vida das pessoas que vivem nos territórios atingidos: “foi uma ruptura traumática que vem a partir de um crime dessa magnitude. Da irresponsabilidade de empresas que visam somente o lucro. É irreparável porque é um crime continuado, que ainda hoje viola os atingidos em suas lutas e reparações. A reparação tem que ser uma luta continuada e exigida como direito, nós não estamos pedindo nada. Estamos exigindo aquilo que é direito de todos atingidos e atingidas”.
Durante a live foi apresentado o caderno do Anexo 1.1, que contém uma proposta sistematizada a partir dos diversos diálogos realizados entre comunidades atingidas e as Assessorias Técnicas Independentes.
Os princípios norteadores citados no caderno envolvem: o protagonismo das pessoas atingidas, a autonomia, a amplitude territorial, a ampla mobilização nos territórios atingidos, a autossustentabilidade, a integração e união, o reconhecimento e a equidade na reparação das pessoas atingidas. Além disso, a qualidade e a celeridade para que a reparação venha o mais rápido possível e respeitando todas as discussões realizadas pelas pessoas atingidas.
Fábio Garrido, Assessor de Integração Metodológica do Instituto Guaicuy, explicou a proposta final do caderno. “Em todo o processo de diálogo, uma preocupação central foi: construir com as pessoas atingidas e sistematizar o que seria, segundo elas, os princípios para participação da governança e da gestão dos 3 bilhões do Anexo 1.1, a partir do princípio de centralidade no sofrimento da vítima”, afirma.
Após apresentação às comunidades atingidas de cada região, o material deve ser discutido com as pessoas atingidas nos territórios e, após validado, será enviado para as Instituições de Justiça. “Essa live não tem o objetivo de aprofundar no caderno, mas sim de fazer um convite para participarem nas reuniões nos territórios e opinarem”, reforça Carla.
Durante a live, as pessoas atingidas falaram sobre o processo de participação coletiva delas, reforçando a necessidade de união e a importância do reconhecimento de todas as pessoas atingidas ao longo da bacia. Foi o caso de Isis Taboas, que falou sobre o protagonismo das pessoas atingidas em organizações populares, coletivas e demais frentes, assessoradas pelas suas ATIs.
Liderjane Gomes da Mata, representante dos indígenas Kaxixó na área 5, afirma que os Kaxixó querem participar dos projetos desde a elaboração até a execução: “somos um povo resistente e vivemos às margens do rio Pará. Fomos excluídos do começo, mas com muita luta conseguimos chegar hoje no reconhecimento que estamos na área 5, que fomos atingidos sim. Hoje não podemos mais nadar no rio pelo tanto de pescador que tem, com tanto anzol, canoa de motor passando. Essa é a nossa dificuldade. É isso que a gente quer de volta”.
Além disso, as pessoas questionaram sobre as garantias do processo de governança pelas pessoas atingidas, como garantir a gestão e protagonismo das pessoas atingidas diante de um cenário em que a política nacional pode se intensificar.
Eliana Marques, de Cachoeira do Choro (Curvelo), reivindica a gestão dos recursos e clama “que haja transparência, que nós tenhamos direito de escolha. Que possamos escolher como deve ser gerido esse recurso, que ele não vá parar na mão de políticos. Que esse anexo seja de fato entregue na mão das comunidades atingidas. Que não nos atropelem. Basta a lama!”
O anexo 1.1 é um dos pontos do acordo assinado entre a Vale e o poder público. Ele trata sobre os projetos de demandas das comunidades atingidas. Ao todo, o acordo destina R$3 bilhões para essas ações, sendo que pelo menos 1 bilhão deve ser para crédito e microcrédito.
O acordo prevê a participação ativa dos atingidos e das atingidas. Ou seja, o acompanhamento na formulação, escolha, detalhamento, execução, acompanhamento, monitoramento, fiscalização e avaliação dos projetos. Neste sentido, as comunidades atingidas da região 1 até a região 5 têm feito diversos diálogos no sentido de garantir participação e uma governança popular.
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