As Instituições de Justiça que representam as pessoas atingidas pela Vale, no processo coletivo que corre na Justiça, apresentaram, na quinta-feira (18/08) uma proposta de resolução das indenizações individuais para compensar os danos causados pelo rompimento da barragem sobre o rio Paraopeba em janeiro de 2019.
A Defensoria Pública Estadual de Minas Gerais (DPMG), o Ministério Público Estadual (MPE) e o Ministério Público Federal (MPF) protocolaram uma petição na qual propuseram ao juiz Elton Pupo Nogueira a contratação de uma perícia imparcial que determine quais os danos, quem deve ser indenizado, as formas e critérios de comprovação, além da valoração das indenizações. Na proposta das Instituições de Justiça, as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), Guaicuy, Aedas e Nacab, atuarão junto às pessoas atingidas na formação de provas, na função de assistentes técnicos.
Na petição, as representantes das pessoas prejudicadas na Justiça solicitam ainda que seja invertido o ônus da prova no processo. Ou seja, que a empresa ré- a Vale -, seja responsável por provar que não atingiu as vítimas, e não o contrário. A inversão do ônus da prova é uma estratégia jurídica utilizada em situações em que há desigualdade de poder, como no caso do processo judicial entre as comunidades atingidas e a mineradora Vale, responsável pelo desastre-crime.
O Instituto Guaicuy avalia que o pedido das Instituições de Justiça é fundamental para a garantia da reparação dos danos individuais sofridos pelas pessoas atingidas que, desde a assinatura do Acordo em fevereiro de 2021, não estavam sendo debatidos no processo judicial. O instituto assessora comunidades de Curvelo e Pompéu (região 4), municípios do entorno do Lago de Três Marias (Abaeté, Biquinhas, Martinho Campos, Morada Nova de Minas, Felixlândia, São Gonçalo do Abaeté, Três Marias, Paineiras – que formam a região 5 junto com comunidades do São Francisco localizadas nos municípios de Três Marias e São Gonçalo do Abaeté).
De acordo com Julia Nascimento, assessora de Reparação de Danos do Instituto Guaicuy, com a aceitação do juiz do pedido das Instituições de Justiça, todo o processo de construção da Matriz de Danos e Reconhecimento realizado pelas Assessorias Técnicas junto às pessoas atingidas poderá ser aproveitado. “Se acatado o pedido das Instituições de Justiça, a Matriz de Danos poderá ser avaliada pelo perito como a versão das pessoas atingidas sobre os danos que elas sofreram, ainda que ela não seja a única versão a ser considerada pela nova perícia. Por isso, os trabalhos da ATI de construção e formação sobre danos individuais, por meio da Matriz de Danos e Reconhecimento, devem continuar, para fazer frente aos argumentos da Vale S/A, que também se manifestará sobre a perícia”, afirma.
A petição inicia com a justificativa das Instituições de Justiça para sua proposta de liquidação dos danos individuais de maneira coletiva, ou seja, apresentando uma estrutura básica que guiará o cálculo das indenizações.
“A apuração dos danos de forma coletiva, por meio da liquidação, condiz com a dimensão dos danos, que apresenta absoluta relevância social e resolve de forma mais efetiva e satisfatória a questão”, cita a petição, ressaltando que tal modo pode evitar a existência futura de múltiplas ações individuais.
As Instituições de Justiça sugerem, então, organizar o processo de liquidação dos direitos individuais com decisões que estabelecem as linhas gerais de atuação, seguidas de menos decisões abstratas, até alcançar decisões concretas.
É proposta a nomeação de entidade técnica imparcial, como perito judicial, para a definição de 1) quais os danos, 2) quem deve ser indenizado, 3) formas e critérios de comprovação e 4) a valoração das indenizações. Esses critérios para identificação de pessoas atingidas e de reconhecimento de danos são baseados na Lei Estadual nº 23.795/21, da Política Estadual dos Atingidos por Barragens.
Para assegurar a participação informada das pessoas atingidas no processo, as Instituições de Justiça indicam que é fundamental a presença das ATIs como assistentes técnicos, garantindo a “paridade de armas”. Ou seja, buscando equilibrar as forças em um processo contra uma das maiores empresas neoextrativistas do continente.
A petição sugere, também, um piso mínimo participativo para a resolução dessa ação coletiva:
As Instituições de Justiça propõem que tanto a perícia quanto as ATIs sejam custeadas pela Vale e que os recursos sejam depositados tão logo o juiz decida pela forma de liquidação dos danos individuais, em caráter de urgência.
Para a solução justa do conflito, as Instituições de Justiça pediram também que o juiz determine a inversão do ônus da prova. Ou seja, que a Vale seja a responsável por provar que não atingiu as pessoas, e não o inverso.
“Há a necessidade de inversão do ônus da prova, cabendo à causadora dos danos o dever de refutar as afirmações tecnicamente fundamentadas […]. No que diz respeito a “o que se deve, a quem se deve e quanto se deve”, as atividades necessitam se desenvolver sobre a dinâmica da inversão do ônus da prova, devendo a ré se desvencilhar das incumbências quando as afirmações estiverem lastreadas em elementos de informação ou decorrerem de deduções lógicas”, diz a petição.
A petição das Instituições de Justiça é uma resposta à decisão do juiz Elton Pupo Nogueira publicada em 26/07. O juiz havia solicitado às instituições que representam as pessoas no processo que apresentassem propostas para a liquidação dos danos individuais.
Agora, o juiz irá avaliar a proposta enviada pelas Instituições de Justiça. A Vale, empresa ré, será intimada a apresentar sua contestação. A audiência de conciliação entre as partes, sugerida pela petição, pode ser convocada pelo juiz.
Caso a proposta das Instituições de Justiça seja aprovada, a perícia e as Assessorias Técnicas terão 60 dias para apresentar seus respectivos planos de trabalho após a data das nomeações.
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