O Instituto Guaicuy enviou às Instituições de Justiça (IJs) um levantamento com todos os pedidos de pessoas atingidas das Regiões 4 e 5 por fornecimento de água que chegaram ao conhecimento da Assessoria Técnica Independente (ATI). De 2020 até agora, pelo menos 910 solicitações de água mineral, água potável ou reclamações e dúvidas sobre a qualidade da água chegaram ao conhecimento do Guaicuy.
O Guaicuy registrou 164 pedidos por água para a Vale na Região 4 e 18 na Região 5 até o início de 2023. Também recebeu 148 pedidos de análise de água de poços ou cisternas na Região 4 e 251 pedidos semelhantes na Região 5, no mesmo período. No total, até fevereiro de 2023, o Instituto registrou 410 demandas relacionadas à água na Região 4 e 406 na Região 5 (816 somando as duas Regiões).
Já de março de 2023 a março de 2024, o Guaicuy listou 33 demandas na Região 4 e 61 na Região 5. Destacam-se os registros de relatos de insegurança quanto à qualidade da água (32 no total) e de sintomas físicos e problemas de saúde atribuídos à qualidade da água (15 no total).
Clique aqui para ler o ofício enviado pelo Guaicuy
O documento foi enviado em 3 de junho, após solicitação das próprias IJs para que as três ATIs levantassem de maneira detalhada “pleitos e reclamações de pessoas atingidas da Bacia do Paraopeba relacionadas a violações do direito ao acesso à água em seus múltiplos usos, com todas as informações pertinentes, inclusive em relação à localização”. O pedido das IJs aconteceu em meio ao retorno da discussão sobre a necessidade da Vale fornecer água às pessoas atingidas.
Em 26 de março, o juiz Murilo Silvio de Abreu intimou a mineradora a esclarecer quais comunidades atingidas ainda contam com abastecimento de água, quais comunidades são abastecidas pela COPASA e quais os critérios usados pela empresa para analisar os pedidos de fornecimento de água. A Vale respondeu em 18 de abril, de maneira ampla e genérica.
Em ofício enviado conjuntamente pelas três Assessorias, foi dito que a ausência do escopo (objetivo) de trabalho relacionado às medidas emergenciais limita as possibilidades de resposta, porque não há metodologia comum de registro desses dados. “Sendo assim, não seria viável a entrega no curto prazo e com a quantidade reduzida de equipe disponível para alinhamentos metodológicos que não são realizados desde a retirada dessas atividades do escopo do Plano de Trabalho do Acordo, atualmente, o único em execução pelas Assessorias”. Por isso, as ATIs entregaram separadamente os dados coletados.
“Conforme entendimento já compartilhado pelas ATIs, as medidas emergenciais de água, impostas judicialmente à Vale S.A. deveriam abastecer todas as pessoas e comunidades demandantes. No entanto, a empresa poluidora-pagadora, de forma discricionária, aplica critérios por ela estabelecidos, desconsiderando os interesses das populações locais, para restringir o direito ao seu recebimento”, avaliam no ofício Instituto Guaicuy, Aedas e Nacab.
Clique aqui para ler o ofício enviado pelas três ATIs
O Instituto dividiu os dados em dois períodos distintos. O primeiro, de julho de 2020 a fevereiro de 2023, é mais completo. Isso porque havia equipes da Assessoria que trabalhavam especificamente com o acolhimento dessas demandas e com o atendimento das pessoas atingidas que apresentam problemas com o fornecimento de água ou insegurança em relação ao consumo da água.
O cenário mudou a partir de março de 2023, quando foi determinado que as ATIs trabalhassem especificamente com os projetos de reparação previstos no Acordo Judicial – que não inclui medidas emergenciais como o fornecimento de água às pessoas atingidas. Ainda assim, o Guaicuy seguiu sistematizando as demandas que surgiram, seja em reuniões entre pessoas atingidas e IJs, seja em reuniões comunitárias ou de Comissões.
Uma observação importante é que os dados a seguir não representam todas as demandas das pessoas atingidas das Regiões 4 e 5 por água, já que muitas pessoas entram em contato direto com a Vale. Os números da ATI apresentam apenas a quantidade de demandas que chegaram ao Guaicuy durante esses anos.
As demandas apresentadas não levaram em consideração o critério imposto unilateralmente pela Vale, que determinou que a mineradora apenas forneceria águas às pessoas ou comunidades cujos poços estivessem localizados a menos de 100 metros de distância do Rio Paraopeba.
Também é importante lembrar que a Vale não considera, para fins de fornecimento de água, as pessoas atingidas da Região 5 (já que o Instituto Mineiro de Gestão das Águas – IGAM não impôs restrições ao uso da água da Represa de Três Marias), o que faz com que haja menos demandas registradas pelo Guaicuy na Região 5 do que na Região 4.
Pessoas atingidas seguem passando sede, cinco anos após o rompimento
Desde o desastre-crime, mais de 5 anos atrás, as pessoas atingidas lutam para acessar água potável e mineral fornecidas pela Vale. No entanto, a mineradora nega muitos dos pedidos (individuais ou coletivos) usando como argumento critérios como, por exemplo, o que indica que apenas as comunidades cujos poços artesianos estejam a menos de 100 metros de distância do Rio Paraopeba devem receber água regularmente.
Segundo Dossiê produzido pelo Guaicuy, de 115 ofícios solicitando fornecimento de água na Região 4 (Curvelo e Pompéu) até 2023, a Vale negou 58% por falta de enquadramento nos critérios e em 24% dos casos afirmou, burocraticamente, que não encontrou pessoas para visita técnica ou que não tem os números de protocolo. Mesmo dentro do critério de 100 metros, muitas são as reclamações e relatos de violação do direito de abastecimento e de insuficiência na quantidade da água fornecida.
Os problemas com a água se repetem em muitas comunidades da Região 4, como Fazendinhas Baú, em Pompéu, que foi retratada no documentário do Guaicuy chamado “Fazendinhas Baú – Comunidade atingida pela Vale luta pelo direito à água”. Os moradores do Baú questionam a medição que a mineradora fez da distância do poço para o rio e afirmam que, nos períodos chuvosos, o poço comunitário fica a menos de 20 metros do leito do Rio Paraopeba.
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