Mesmo com lucro de R$ 95,9 bilhões em 2022, a mineradora alega que a implantação dos planos de trabalho do Guaicuy e do GEPSA, no processo de reparação das pessoas atingidas de Antônio Pereira, seria desperdício de tempo e dinheiro.
Na decisão de segunda instância, proferida no dia 18 de abril, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) se recusa a suspender a determinação pelo depósito dos valores para custeio das atividades do Instituto Guaicuy, Assessoria Técnica Independente eleita pela comunidade de Antônio Pereira, e do Grupo de Estudos e Pesquisas Socioambientais (GEPSA), entidade técnica multidisciplinar escolhida pela justiça para atuar no processo de reparação dos danos causados pela mineradora em função do risco de rompimento e do consequente descomissionamento da barragem Doutor, no distrito de Antônio Pereira, em Ouro Preto.
No recurso, a Vale, que figura entre as cinco maiores empresas do ramo da mineração no mundo e também é ré nos casos de rompimento das barragem de Fundão (Mariana, em 2015) e Mina Córrego do Feijão (Brumadinho, em 2019), alega que “o início imediato dos trabalhos levará a um irreversível desperdício de recursos e perda de um precioso tempo, que poderia ser concentrado no melhor planejamento e execução dos papéis definidos para o GEPSA e para o Instituto Guaicuy”. O argumento foi considerado infundado pelo TJMG. O tribunal manteve a decisão judicial que aprova os planos de trabalho das duas entidades técnicas junto à população atingida, que sofre com os danos causados pela mineradora em Antônio Pereira.
A suposta sobreposição de finalidades do trabalho do Guaicuy e do GEPSA alegada pela mineradora também foi rechaçada pela justiça, que manteve a determinação do depósito parcial do dinheiro necessário para assegurar os primeiros seis meses de atividades das entidades técnicas no território. A decisão do TJMG informa ainda que qualquer eventual reajuste nos valores destinados à ATI e ao grupo de pesquisa deve ser avaliado posteriormente. Acesse a decisão na íntegra.
Após muita luta organizada, a Política estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB), instituída em 15 de janeiro de 2021, passa a garantir às comunidades atingidas – entre outras coisas – o direito à reparação integral dos impactos socioeconômicos e o direito à Assessoria Técnica Independente (ATI). A PEAB garante ainda que a ATI seja escolhida pelos atingidos e custeada pelo empreendimento minerário, para orientá-los no processo de reparação integral.
Apenas um mês depois dessa importante conquista, em fevereiro de 2021, as pessoas de Antônio Pereira escolheram o Instituto Guaicuy para atuar como Assessoria Técnica Independente da comunidade, que sofre com o medo de rompimento e com os danos causados pelo descomissionamento da barragem Doutor, da Vale. Quatro meses depois de eleito, no dia 24 de junho de 2021, o Guaicuy protocolou na Ação Civil Pública a primeira versão de seu plano de trabalho.
Desde então, os recursos judiciais interpostos pela mineradora, a morosidade do processo judicial e os conflitos de entendimento sobre o plano de trabalho e atribuições da ATI no território foram fatores de demora na efetivação desse direito.
Para tentar um acordo sobre o escopo dos trabalhos, no dia 21 de setembro de 2021, foi realizada uma audiência de conciliação com a empresa ré. Nela foram debatidas as questões consideradas inapropriadas pela Vale, tanto no Plano de Trabalho da ATI, quanto do GEPSA, grupo escolhido pela juíza Kellen Cristini de Sales e Souza, da 1ª Vara Cível da Comarca de Ouro Preto, para atuar como perito técnico responsável por fazer o cadastro das pessoas atingidas, elaborar o diagnóstico socioeconômico, a matriz de danos e o plano de reparação da comunidade.
Ambas as entidades técnicas fizeram adequações em seus planos de trabalho, que foram atualizados no processo em 13 de outubro de 2021. Após recebimento das propostas readequadas, a juíza ouviu mais uma vez a empresa ré e determinou, em 19 de agosto de 2022, pela aprovação dos novos planos de trabalho. Na ocasião, ela também fixou os valores que a Vale deveria depositar em juízo para o início das atividades das duas organizações. Em cumprimento a essa decisão judicial, no final de setembro de 2022, a mineradora finalmente depositou R$ 2.880.000,00 – para custear os seis primeiros meses de trabalho da ATI em Antônio Pereira -, e R$ 9.120.000,00 – para os custos do primeiro semestre de atividades do GEPSA.
Mesmo com todo esse moroso caminho percorrido, a Vale recorreu por duas vezes da decisão judicial, tendo seus argumentos invalidados e recursos negados pela justiça em primeira e segunda instâncias.
No dia 01 de dezembro de 2022, o Instituto Guaicuy iniciou formalmente o trabalho como ATI da comunidade e Antônio Pereira, com o objetivo de garantir o direito à informação (inclusive técnica) às pessoas atingidas, além de buscar assegurar sua participação informada nos processos de reparação integral dos danos causados pela mineradora.
Desde então o setor administrativo da ATI já foi estruturado e a equipe selecionada para atuação no território, tanto com atendimentos individuais quanto coletivos (online e presenciais). Entre março e abril de 2023, tiveram início as visitas domiciliares e reuniões institucionais com representantes do poder público local. E, em 27 de abril deste ano, foi realizada a primeira reunião de núcleos comunitários, que são espaços coletivos de organização e luta pela reparação integral.
Entre os trabalhos que executamos enquanto ATI estão o acolhimento psicossocial e jurídico, mobilização e comunicação social. Para isso, nossa equipe é formada por profissionais de diversas áreas de conhecimento, como psicólogos, assistentes sociais, advogados, comunicadores, jornalistas e pessoal administrativo. Todas/os com experiência em metodologias de acolhimento, escuta qualificada para identificação de danos sofridos, atendimento e informação às pessoas atingidas.
A Assessoria Técnica de Antônio Pereira que atua diretamente no território é composta pelas equipes:
Para entrar em contato com essa equipe, as pessoas atingidas podem ligar ou mandar mensagem de WhatsApp para o número: (31) 9 7256-7131 ou enviar um e-mail para: ati.antoniopereira@guaicuy.org.br.
Os acolhimentos psicossociais e/ou jurídicos, em formato presencial ou online, podem ser solicitados também pelo telefone: (31)97259-7181.
Por Ellen Joyce Marques Barros e Laura Alice Souza Da Silva
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