Instituto Guaicuy

Centenas de pessoas participam de evento de lançamento de dados do Instituto Guaicuy

26 de janeiro, 2024, por Joana Tavares

Como parte do compromisso com a transparência e com a participação informada, banco de estudos foi lançado publicamente na semana dos cinco anos do rompimento da barragem da Vale

“Não existe reparação sem participação”. Essas palavras pintadas na faixa que decorava a mesa, assim como objetos que representavam um barco, artigos de pesca, água e natureza, compunham o ambiente do seminário “Em busca de respostas: Divulgação de dados, estudos e produções elaborados com as pessoas atingidas do Baixo Paraopeba, Represa de Três Marias e Rio São Francisco”, promovido pelo Instituto Guaicuy no dia 24 de janeiro, como parte dos eventos em homenagem e memória dos cinco anos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. 

O evento, promovido em parceria com a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (onde foi sediado), o Projeto Manuelzão e o Conselho Regional de Biologia, foi organizado em vários momentos, e contou com a participação presencial de cerca de 200 pessoas, incluindo pessoas atingidas, pesquisadores, jornalistas, representantes de comitês e conselhos, parlamentares, enquanto outras centenas acompanharam pela transmissão online. O encontro teve início com uma mística em que pessoas atingidas das Regiões 4 e 5 trouxeram por escrito os vários tipos de danos sofridos e com um minuto de silêncio em respeito à vida das 272 pessoas que foram ceifadas pela lama da Vale em 2019.

Em seguida, com a medição da diretora do Guaicuy Carla Wstane, pessoas atingidas das cinco regiões, representantes de grupos auto-organizados, movimentos sociais, Instituições de Justiça (IJs) e outras Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) fizeram suas saudações e falaram sobre a importância de dados científicos e embasados como ferramentas na luta por reparação. 

Kléber Castelar, da Comissão de Pessoas Atingidas de Novilha Brava e Campo Alegre (Pompéu) e integrante do grupo auto-organizado Guerreir@s por Justiça, destacou que espera que os dados divulgados pelo Guaicuy sejam utilizados pelo juiz do caso e pelas Instituições de Justiça para fins de indenização individual. 

Fernanda Perdigão, integrante do grupo Paraopeba Participa, lembrou da importância de esse tipo de evento acontecer em um espaço de uma universidade pública, pelo processo de disputa de narrativa que acontece em torno da reparação. “Os danos estão sendo mensurados por quem os causou. É a Vale que realiza a análise ambiental e executa o plano de risco da saúde humana. Se ela se esforçou para falsificar um laudo [de segurança da barragem], o quanto ela está se esforçando para forjar danos?”, questionou, defendendo que o conhecimento deve estar disponível para as pessoas que estão sofrendo os impactos. 

Acesse nosso Flickr para ver todas as fotos do evento: Clique aqui!

Representante da Defensoria Pública Estadual de Minas Gerais (DPE-MG), a doutora Carolina Morishita falou sobre a disputa do modelo de reparação e de assessoria técnica, visto que não é a ATI a responsável pela efetivação de políticas públicas, mas que a assessoria é fundamental no processo de levantamento de dados e demandas para embasar os órgãos que têm essa função e poder. Destaca-se, também, a participação de Vanessa Campolina, promotora do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

Os demais participantes na mesa reforçaram a importância da luta comum por direitos. Em seguida, foi projetado o documentário “De Angueretá a Barra do Rio de Janeiro: o rompimento da barragem da Vale para além de Brumadinho”, realizado pelo Instituto Guaicuy, com depoimentos das pessoas atingidas das Regiões 4 e 5.

Assista aqui o documentário:

Os participantes também receberam o exemplar da revista ilustrada “Cinco anos do desastre-crime da Vale: no curso das águas, a luta por reparação”, da 11ª edição do jornal Piracema, e um guia de acesso ao banco de dados que estava sendo lançado.

 O trabalho da ATI e a apresentação dos dados

Em seguida, o diretor institucional da ATI Paraopeba Marcus Vinicius Polignano abriu o terceiro bloco do evento, e trouxe o contexto do trabalho da assessoria técnica. Em uma fala emocionada e política, Polignano criticou a postura da mineradora, que foi responsável por tantos prejuízos e dores a pessoas e territórios. “Quem viu o vídeo aqui não tem dúvida, as pessoas foram destituídas do seu modo de vida, do direito de continuar fazendo o que sempre fizeram, e não são reconhecidas como atingidas, o que é realmente um absurdo”, exemplificou.

A mesa foi então composta por quatro mulheres, que apresentaram como foram feitas as pesquisas e deram alguns exemplos de resultados dos dados e estudos realizados pela assessoria desde o ano de 2020 até hoje. 

Julia Nascimento, gerente do Instituto Guaicuy, apresentou os eixos que organizam a biblioteca no site: Diagnóstico do Território Atingido (composto por relatórios ambientais, de saúde e relatórios socioeconômicos e territoriais), Assessoramento Técnico para Reparação (composto por seis temas – Medidas Emergenciais, Indenizações Individuais, Sistemas de Tratamento de Água Instalados pela Vale S.A, Projetos Comunitários e Crédito e Microcrédito, Reparação Socioambiental e Programa de Transferência de Renda) e Outros, que conta com estudos realizados com as outras ATIs, além de um link para todos os documentários produzidos pelo Guaicuy como ATI no Paraopeba.

Confira aqui o Guia de Acesso aos Dados

Flávia Siqueira, analista de Mitigação, explicou o passo a passo para acessar os dados ambientais, organizados em vários passos e tipos de documentos. 

Acesse aqui: Banco de Dados_finalizado_17_01_24_09h18_com links (1).pdf – Google Drive

Foram disponibilizadas desde planilhas completas dos dados, até laudos, relatórios, boletins, mapas e fotos. Todas as seções contam com resumo executivo.

Mônica Campos, supervisora da assessoria de Mitigação do Guaicuy, trouxe dados sobre os danos à água e aos peixes nas Regiões 4 e 5. Um dos exemplos: foram coletadas 386 amostras de peixes na Região 4 e percebidos 55,8% com algum tipo de alteração, além de 1209 amostras na Região 5, com 51% de alterações detectadas. “Não podemos afirmar qual o real risco à saúde humana sobre o consumo desses peixes. Para isso, precisaríamos de outras informações que fogem ao escopo da ATI, mas esses dados precisam ser cobrados continuamente”, afirmou Mônica. “Reparação também é a retirada efetiva e eficaz dos rejeitos que estão na calha do Paraopeba”, frisou.

A supervisora Isabela Caiafa ficou responsável por apresentar os dados da área da saúde, lembrando que por trás de todas as informações estão pessoas, com dores e histórias, e que todos os dados estão anonimizados, protegendo a privacidade de quem deu as entrevistas. Ela falou do histórico do acolhimento psicossocial e do dashboard da saúde, que pode ser acessado aqui.

Com uma apresentação que contou com a contextualização sobre o território, e com a explicação de como foram organizados os estudos – lembrando das diversas pessoas e equipes que contribuíram para eles – a mesa foi concluída com a fala da assessora de mitigação do Guaicuy, Paula Constante. Ela emocionou os presentes falando sobre a incerteza das milhares de famílias que dependem da água, sobre os jovens que vão embora de seus territórios, e sobre a luta que não cessa. 

Todos os estudos e dados podem ser acessados aqui: Banco de dados e estudos (guaicuy.org.br)

Encerramento

A última mesa do evento foi composta por quatro mulheres atingidas, que trouxeram vida aos dados, falando como tudo isso impacta diversos aspectos de seus cotidianos. Ediléia Aparecida de Oliveira, pescadora de Abaeté, por exemplo, falou: “É muito injusto nossa área não ser reconhecida. Perdemos nossa renda e o lazer dos nossos filhos. Tive que vender meu lote na beira do córrego e não tenho solução para fazer outro tipo de negócio. Tudo que a gente tinha era nosso pescado e hoje não temos mais”. 

Por fim, o espaço foi aberto para perguntas e debates, e concluído com o compromisso do Instituto Guaicuy com a transparência, a democratização da informação e a luta pela reparação integral, com participação de todas as pessoas atingidas, que são e sempre devem ser as protagonistas do processo.

Confira a gravação na íntegra do evento

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